Em 2021, a economia do Brasil recuperou-se do baque provocado pela pandemia de COVID-19, avançando 4,6% sobre o ano anterior – o maior crescimento anual em 11 anos, vindo logo depois da maior queda, de 3,9%, desde 1996. Os dados foram divulgados pelo IBGE nesta sexta-feira (4). A combinação de inflação persistente, juros elevados e incertezas políticas – agora também no campo internacional, com a invasão da Ucrânia pela Rússia –, no entanto, tem feito a visão do mercado se distanciar cada vez mais da do governo brasileiro.
Antes do ano passado, o maior crescimento anual já registrado pelo IBGE tinha ocorrido em 2010, quando o país cresceu 7,5%. Os setores de serviços (com alta anual de 4,7%) e o comércio, apesar da alta de preços e da redução da renda do trabalhador, estão se recuperando, ainda que em um ritmo menor do que o previsto lá atrás. A indústria e agricultura (com recuo de 0,2%), por sua vez, patinam com a falta de componentes e a alta dos custos, respectivamente, entre outros fatores.
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De forma geral, a leitura de 2021 veio ligeiramente pior do que a projeção oficial do Ministério da Economia, de crescimento de 5,1%. Além disso, o PIB está apenas 0,5% acima do quarto trimestre de 2019, período pré-pandemia, e 2,8% abaixo do ponto mais alto na série histórica, no primeiro trimestre de 2014, segundo o IBGE.
Também nesta sexta-feira, o IBGE revisou números do primeiro e segundo trimestres de 2021: PIB brasileiro cresceu 1,4% entre janeiro e março (ante 1,3% de antes) e caiu 0,3% no segundo trimestre (ante -0,4% de antes). Na comparação com o quarto trimestre de 2020, o PIB teve expansão de 1,6%, ante expectativa de 1,1% nessa base de comparação.
Com um PIB nominal de US$ 1,608 trilhão no ano passado, o país não está mais entre as dez maiores economias do mundo, segundo a agência de classificação de crédito Austin Ratings.
A taxa básica de juros Selic saiu da mínima de 2% e está em 10,75%, em um ciclo de aperto monetária promovido pelo Banco Central para tentar domar a alta dos preços que deve ter continuidade neste mês, quanto o BC volta a se reunir.
Somam-se ao quadro a variante Ômicron do coronavírus, bem como incertezas em ano de eleição presidencial, que deixa a cena fiscal sob os holofotes. E desde a semana passada entraram ainda na lista de interrogações a invasão da Ucrânia pela Rússia e como isso irá afetar a inflação e o crescimento mundial.
De acordo com economistas, a guerra pode impor mais um vento contrário à economia do Brasil e da América Latina como um todo. O único contraponto seria o salto dos preços de algumas commodities exportadas pelo país e pela região.
Enquanto os países desenvolvidos têm estofo fiscal para adiar ao máximo a retirada das medidas de estímulo e colocar no eixo a relação demanda-oferta, os países emergentes são obrigados a aumentar as taxas de juros como forma mais rápida de frear a alta dos preços. Diante disso, a recuperação real, dizem os economistas, começará lentamente apenas em 2022 e (como sempre na América Latina) de maneira bastante desigual.
Segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), da ONU, a América Latina enfrenta seu maior desafio fiscal desde a crise da dívida pública no início dos anos 1980, quando o PIB da região caiu -6,1%.
Para a Oxford Economics, o aperto fiscal e monetário que virá em 2022 já faz a América Latina olhar para a recuperação advinda simplesmente da reabertura da economia pelo retrovisor. E mesmo com o aperto esperado, a convergência para as metas de inflação será lenta devido à persistência da inflação importada.
A CEPAL prevê um crescimento do PIB de 0,5% para o Brasil em 2022, enquanto o FMI espera uma expansão de 0,3% e a Oxford Economics, estagnação.
Grandes instituições nacionais como o Itaú Unibanco estão muito menos otimistas. O Itaú-BBA, braço de pesquisa do maior banco do país, prevê queda de 0,5% no PIB deste ano.
Já a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia disse nesta sexta-feira que a normalização dos choques de oferta, o restabelecimento das cadeias produtivas, a melhoria do mercado de trabalho, a redução do risco hidrológico e a ampliação dos investimentos privados fundamentam uma estimativa de crescimento em 2022 superior ao projetado hoje pelo mercado. Até novembro do ano passado, a administração de Jair Bolsonaro apostava em um crescimento de 2,1% em 2022. Uma nova projeção deve sair neste mês.