Neste conteúdo especial, o LABS analisou o comportamento do principal grupo de turistas que veio ao país nos últimos anos: os latino-americanos.
Seja o crescimento do segmento de negócios em São Paulo ou a busca pelo sol e mar no Rio de Janeiro, os destinos e as opções de lazer são apenas a ponta do iceberg da atividade:a cadeia produtiva do turismo engloba desde restaurantes até as atrações culturais de um local.
Dado o potencial inerente, não há dúvidas de que ainda se pode incrementar as qualidades naturais do país e fechar os próximos anos com montantes maiores. O desafio é grande: atualmente, dos 1,3 bilhão de viajantes no mundo em 2017, 6,5 milhões visitaram o Brasil, cerca de 0,5%. O México, no mesmo ano, recebeu 6 vezes mais turistas.
Lá, o país vizinho, Estados Unidos é o principal emissor de turistas. Em 2017, 59% deles eram estadunidenses, visitando cidades como Cancun, Playa del Carmen e Cabo San Lucas.
A localização geográfica do Brasil faz com que outro perfil seja destaque: os latino-americanos, principalmente vindos da América do Sul. Mais de 4 milhões de viajantes da região elegeram o país como destino turístico em 2017 - e esse número tende a crescer. O fato de o idioma ser diferente não é uma barreira.
Latino-americanos representaram pouco mais de 63% do total de chegadas em solos brasileiros no ano de 2017. Desde 2010, o Brasil teve um aumento de 73% no número de viajantes vindos da Argentina, Chile, Uruguai, Paraguai, Colômbia, Peru, Bolívia, México e Venezuela.
Mesmo nos anos das Olimpíadas no Rio de Janeiro e da Copa do Mundo - épocas em que o país se tornou destino global -, o protagonismo da América Latina no turismo brasileiro continuou firme: em 2014, 50% dos turistas no Brasil eram da região e em 2016, 57%.
Sem dúvidas, as fronteiras influenciam a dinâmica do turismo. No Rio Grande do Sul, estado que faz divisa com Argentina e Uruguai, 95% dos turistas vinham desses países. Já no Mato Grosso do Sul, segundo o Anuário Estatístico do Turismo, em 2017 foi registrada a chegada de 48 mil bolivianos e 24 mil paraguaios: 97% do total de viajantes estrangeiros no estado. Essa é uma realidade distinta de São Paulo, por exemplo, onde apenas se pode chegar por via aérea ou marítima. Dentre os cinco principais países emissores de turistas para SP, apenas 27% eram da América Latina.
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Uma das campanhas do Ministério do Turismo para a temporada de verão de 2019 é direcionada aos hermanos. Se por um lado os latino-americanos estão unidos pelo idioma - o espanhol - por outro, esses turistas divergem muito com relação aos hábitos e preferências quando viajam pelo Brasil.
Em novembro de 2018, o La Nación - um dos principais jornais da Argentina - publicou quatro reportagens sobre destinos turísticos no Brasil: um artigo sobre Fernando de Noronha; uma lista dos parques aquáticos do país; um especial sobre Lajedo Pai Mateus, na Paraíba; e, é claro, um guia com as melhores praias do Sul.
Segundo relatório da Embratur, é justamente a partir do mês de setembro que os argentinos começam a planejar e adquirir suas viagens de verão e, nesses meses, os destinos brasileiros voltam a ser assunto.
Ainda que rivais no futebol, o "Canarinho" e a "Albiceleste" mantêm uma boa e significativa relação quando se trata da economia do turismo em ambos os países. A proximidade e a busca por bons momentos entre a areia e o mar fazem com que a Argentina seja a principal emissora de viajantes para o Brasil.
Na época, o aumento de preços no Brasil foi menor que o da inflação na Argentina, fazendo com que a viagem se tornasse uma opção barata. Isso, somado ao segundo ano do fim da restrição de compra de dólar no vizinho, contribuiu para que 2017 fosse o período com mais turistas argentinos da história.
A proximidade também ajudou: 934 mil argentinos chegaram de ônibus ou carro pelo Rio Grande do Sul, rumo às praias do litoral sul do Brasil. A via terrestre também é a principal forma de chegar à Foz do Iguaçu, um dos cinco principais destinos dos hermanos.
Ainda que o gasto médio do turista argentino seja relativamente baixo, cerca de US$56,87 por dia, são eles que passam mais pernoites no Brasil e que mais alugam casas para a temporada. Além disso, 6 em cada 10 argentinos viajam para o Brasil em grupos, seja em família ou com os amigos.
Ao longo do ano de 2018, alguns hábitos de viagem sofreram mudanças. Segundo pesquisa da Kantar Millward Brown e Kantar TNS, dada a situação econômica, 68% dos argentinos mudarão seus planos de viagem. No entanto, 80% asseguraram que ajustarão o orçamento para garantir a viagem do ano. Dentre esses ajustes, os principais são:
O recorde batido em 2017 pode não ser novamente uma realidade em 2018, já que atualmente as condições econômicas são completamente diferentes. A desvalorização da moeda argentina e a retomada da inflação poderão influenciar esta época de veraneio. No entanto, chegar até as praias brasileiras continua sendo uma opção mais viável do que ir até o Caribe ou Miami, por exemplo.
Uma das nações mais estáveis e prósperas da América do Sul, o Chile se destaca por ter uma economia de rápido crescimento na região. Reflexo das melhorias econômicas é o aumento no número de turistas chilenos pelo mundo.
Ainda que esses números estejam longe - bem longe - do primeiro lugar, Argentina, o interesse pelo Brasil vem aumentando ao longo dos anos. De 2010 a 2017, o número de turistas chilenos cresceu 70%. Considerando apenas o último ano, a variação foi de aproximadamente +10%. O Brasil já se tornou um destino querido pelos chilenos e 56% daqueles que vieram ao Brasil em 2017, já haviam visitado o país outras vezes.
A principal forma de acesso ao país é, portanto, pela via aérea, principalmente pelos aeroportos de São Paulo, responsável por 52% das chegadas em 2017. De acordo com levantamento feito pela Embratur, atualmente há 119 frequências semanais diretas saindo do Aeroporto Arturo M. Benitez, em Santiago do Chile, e chegando ao Brasil (86 para São Paulo e 33 para o Rio de Janeiro). Além desses, a partir de 15 de janeiro de 2019 serão lançados 3 novos voos que farão o trajeto direto entre Santiago do Chile e Porto Alegre.
De dezembro a fevereiro de 2017, foi registrada a chegada de cerca de 110 mil chilenos (32% do total).
Porém, ao longo do ano um número considerável chega ao Brasil motivado pelos negócios. Enquanto no Rio de Janeiro, o boom é causado pelos meses de veraneio, em São Paulo a quantidade de chilenos mantém-se em uma média de 14 mil por mês, independente do período do ano.
Dentre os latino-americanos, são os que possuem maior gasto diário no país, cerca de US$75,71.
Com o crescimento do número de turistas chilenos no mundo, cresce também a busca por informações sobre os destinos. De acordo com a Diretoria de Inteligência Competitiva e Promoção Turística do Brasil, os chilenos costumam planejar e adquirir suas viagens com antecedência. Para tal planejamento, hoje 60,7% procuram por informações sobre o Brasil pela internet, percentual maior do que em 2013, quando 46% utilizavam essa ferramenta. Aqueles que buscam por informações através de agências de viagens representam 6,7% do total de turistas que chegaram. De 2013 para 2017, esse percentual caiu pela metade.
O país que faz fronteira com o Mato Grosso do Sul e o Paraná vem se destacando no cenário econômico regional. Com um crescimento médio de 5,8%, o Paraguai é um dos líderes do bom desempenho econômico na América Latina, indo na direção contrária de outros países importantes. Nos últimos anos, a economia cresceu em média 4,5%, mais rápido que a maioria de seus vizinhos.
Dentre os países da América Latina, além de representar uma porção relevante do total de turistas estrangeiros que visitam o Brasil, o Paraguai figura há anos como um dos cinco principais mercados emissores ao seu país vizinho.
Não é de se estranhar que 230 mil turistas do país, o equivalente a 71,3%, vieram pelo Paraná por via terrestre.
Motivados pelas paisagens litorâneas, os turistas vindos do Paraguai também preferem visitar o Brasil na temporada de verão. Com o tererê sempre em mãos, os paraguaios movimentam as rodovias que ligam o país ao litoral catarinense e paranaense - principais destinos desses turistas, junto com Foz do Iguaçu, é claro.
Na maioria das vezes, os turistas chegam ao Brasil em família (44,2%), aproveitando o período das férias escolares. Os familiares também são uma importante fonte de informação e opinião sobre o Brasil, sendo tão importante quanto a internet no momento do planejamento da viagem.
Por sua estabilidade política e econômica, o Uruguai já foi considerado a "Suíça da América do Sul". Segundo o World Bank, atualmente o país é destaque na América Latina por contar com uma sociedade igualitária e a maior classe média da região. Essas qualidades ficam ainda mais evidentes quando se trata dos números do turismo emissivo.
Mesmo com 3,4 milhões de habitantes, em 2017 o Ministério do Turismo do país apontou a saída de 1,7 milhões de uruguaios rumo a outros países.
Naquele ano, o número foi superior ao de turistas chilenos e paraguaios. A queda no ranking não aconteceu pela diminuição da demanda uruguaia, ao contrário: de 2012 a 2017, houve um incremento de 29% no número de turistas para o Brasil. No entanto, Chile e Paraguai registraram, no mesmo período, um crescimento de 37%.
De mala pronta rumo ao Brasil, da mesma forma que os outros países limítrofes, a principal forma de chegada é por via terrestre. Em 2017, o fluxo rodoviário representou 59% das entradas de uruguaios no país, das quais 53% se deram apenas pelo Rio Grande do Sul.
Em março, os uruguaios podem aproveitar a Semana do Turismo, sete dias de feriado que corresponde à Semana Santa. Nesse período, eles também aproveitam para curtir as praias do Sul do Brasil.
Assim como os argentinos, o planejamento da viagem ao Brasil acontece poucos meses antes das férias de verão ou de inverno. Para tanto, o turista uruguaio consulta a internet, além de amigos ou parentes.
Aos poucos, os habitantes desses quatro países estão aumentando as vindas ao Brasil. Juntos, em 2017 eles representaram 7% do total de chegadas.
O Brasil ainda não entrou na lista dos 5 principais destinos dos colombianos. Em 2017, os lugares foram ocupados por México, Equador, Panamá, Peru e Venezuela.
Ainda assim, desde 2010 houve um crescimento de 64% no número de turistas colombianos no Brasil. Durante os últimos anos, a primeira grande entrada desses turistas foi em 2014, ano da Copa do Mundo. Reforçando a presença sul-americana no país e compartilhando o amor pelo futebol, nos anos seguintes, registrou-se em média a chegada de 131 mil colombianos
O Brasil registrou crescimento de 42% no número de turistas bolivianos de 2010 a 2017. As perspectivas para os próximos anos são promissoras, porém um dos desafios é a conectividade: atualmente, a chegada por via aérea é limitada, já que as opções de voos diretos têm apenas São Paulo ou Cuiabá como destino.
Segundo a embratur, essa movimentação gerou receita de aproximadamente US$63 milhões no país.
São Paulo atraiu principalmente aqueles turistas que vieram ao Brasil pelos negócios. O estado recebeu quase metade de todos os peruanos que entraram no país em 2017. Com relação ao segmento de lazer, Rio de Janeiro e Foz do Iguaçu foram os destaques do ano.
Além disso, em 2017, os mexicanos realizaram cerca de 22 milhões de viagens internacionais, sendo 18 milhões somente aos Estados Unidos. Na América do Sul, Colômbia e Argentina são os principais destinos escolhidos.
O Brasil ainda não é um destino turístico fortemente competitivo para esse público. Segundo o Boletim de Inteligência Competitiva da embratur, os mexicanos consideram que uma viagem ao Brasil é muito cara e que o produto oferecido pelo país não corresponde ao valor cobrado.
2014 foi o ano de maior chegada de turistas mexicanos: 109 mil estiveram no Brasil, a grande maioria motivada pela Copa do Mundo. Após esse ano, o número de mexicanos caiu. Em 2017, apenas 81 mil.
O turismo é capaz de difundir a cultura de um país, mudar estereótipos, promover cidades em crescimento e impulsionar a economia.
O Brasil, país com um litoral de 7.5 km2 e a maior biodiversidade do mundo possui um potencial inerente. Não há dúvidas de que ao incrementar os diversos destinos do país para a demanda turística, nos próximos anos os indicadores econômicos da atividade serão ainda mais expressivos. E incrementar os destinos e a oferta turística implica em conhecer bem o público: de onde vem, como se informam, como compram a viagem, dentre outras informações relevantes.
Comportando-se de maneiras distintas e com diferentes hábitos e preferências diferentes, a chegada dos turistas latino-americanos ao Brasil indica uma série de oportunidades para quem opera - ou pode passar a operar - nesse setor. Pode-se investir em novas atrações sazonais naqueles lugares que já recebem muitos turistas, como é o caso de Florianópolis para os Argentinos. Ou, dada a situação econômica da Argentina, incrementar pacotes familiares, personalizados e mais econômicos, oferecendo diferentes formas de pagamento.
A tendência das bleisure trips - opção que combina viagens corporativas com o lazer - pode ser uma oportunidade a ser explorada pensando nos chilenos que vem ao Brasil à negócios, já que costumam passar cerca de uma semana no destino e gastar em média US$116 por dia.
1,7 milhões de viajantes uruguaios saíram do país em 2017. Desses, 328 mil vieram ao Brasil. O que poderia ser feito para o país atrair mais turistas dessa região - já que há muito potencial a ser explorado? Uma vez que os uruguaios já conhecem as praias do Sul do país, quais seriam as alternativas para promover também outras experiências culturais ou outros segmentos turísticos?
As fronteiras a serem rompidas não são apenas físicas: articular melhor o on e o off no processo de compra e aproveitar o uso da internet - principal fonte de informações sobre os destinos - para consolidar a venda da viagem e das experiências, também aparece como uma oportunidade de crescimento.
Mais do que romper fronteiras, estreitar laços. A importância do mercado latino-americano para o turismo brasileiro vem se provando inquestionável, e isso indica um trajeto cada vez mais claro: as possibilidades estão mais perto do que se imagina