Bilionárias em tempo recorde: startups recebem novas rodadas com intervalo cada vez menor
Imagem: Shutterstock
Negócios

Bilionárias em tempo recorde: startups recebem novas rodadas com intervalo cada vez menor

Rodadas consecutivas, cheques cada vez maiores, valuation disparando: o LABS conversou com Michael Nicklas, do Valor Capital Group, e Eduardo Vieira, do SoftBank na América Latina, sobre os possíveis riscos para empresas e investidores

Read in englishLeer en español

Embora a injeção de capital de risco em startups da América Latina tenha batido vários recordes em 2021, alcançando bilhões de dólares, alguns fundadores que participam do jogo do capital de risco mantém um pé atrás em relação às rodadas de investimento consecutivas, dentro de intervalos cada vez menores, que diluem cada vez mais os sócios da empresa

E não se trata apenas de dividir a fatia do bolo. Alguns executivos relataram ao LABS o risco de empreendedores inexperientes construírem empresas para investidores – o que, na prática, rodada após rodada, eleva o valuation da empresa para os próprios investidores. Algo parecido com o que aconteceu com a WeWork: muitos investidores apostaram que a empresa traria lucro, mas quando a companhia abriu os papéis para fazer um IPO, se revelou uma decepção para o mercado, acumulando prejuízos. 

Outros fundadores ouvidos pelo LABS afirmam que se a empresa capta muito dinheiro, isso também pode causar uma desproporcionalidade em termos de operação, trazendo pressão de investidores e risco para a empresa. 

LEIA TAMBÉM: América Latina: valor médio de aportes em startups salta de US$ 13 milhões para US$ 31,9 milhões em novembro

Questionado sobre esse risco, o sócio do Valor Capital Group, Michael Nicklas, disse que em grande parte dos investimentos o Valor entra nos estágios mais iniciais, em rodadas Seed e Série A. Dessa forma, nas rodadas subsequentes, nas quais geralmente acontece a aceleração do valuation da empresa, Nicklas afirma que o Valor “está um pouco mais protegido”, porque o fundo já entrou nos investimentos em uma etapa anterior. 

Michael Nicklas, Managing Partner do Valor Capital Group. Foto: Divulgação/Valor Capital Group
Michael Nicklas, Managing Partner do Valor Capital Group. Foto: Divulgação/Valor Capital Group


“A decisão para a gente [nesse caso de rodadas subsequentes] é baseada em se exercemos o pro-rata [direito concedido a um investidor que permite que ele mantenha seu nível inicial de porcentagem de propriedade durante as rodadas de financiamento posteriores] ou não em uma rodada subsequente”, explicou, já que um mesmo investidor não pode liderar rodadas subsequentes.

Realmente o mercado está acelerado. Temos vários casos em que fizemos o investimento e nem tínhamos realizado o aporte ainda e a empresa já havia recebido outro term sheet [proposta de investimento]. Aí a gente tem que tomar uma decisão: se vamos exercer o nosso pro-rata e fazer a rodada subsequente naquele valor. A gente avalia isso caso a caso. 

Michael Nicklas, sócio do Valor Capital Group

Uma certeza é: os valuations das empresas têm subido cada vez mais rápido; o grupo de unicórnios já não é tão seleto assim e já abrange quase 30 startups na América Latina, uma vez que as companhias precisam de cada vez menos tempo para atingir o status bilionário. Cerca de quatro anos atrás, uma rodada Seed no Brasil captava de US$ 1 a 2 milhões. Hoje, esse valor dobrou para US$ 3 ou US$ 4 milhões, conforme lembrou Nicklas.

“Mas temos empreendedores seriais que conseguem demandar mais porque eles têm mais experiência, tem uma rede de contatos, o ecossistema está mais maduro e o processo de crescimento das empresas está acelerado”, ponderou. 

LEIA TAMBÉM: América Latina vai de 2 a 34 unicórnios em quatro anos, aponta Sling Hub

É o caso da Pomelo, criada por Gastón Irigoyen, funcionário número 5 do Google para a América Latina hispânica. A fintech é a quarta empresa de Irigoyen, que foi CEO do banco digital argentino Naranja X. Com ele, Hernan Corral (CPO), que passou 12 anos na construção do Mercado Pago, e Juan Fantoni (CCO), ex-diretor da Mastercard, compõem o quadro de fundadores da startup

Ainda sem operações efetivas, a Pomelo captou uma rodada Seed de US$ 9 milhões liderada pela monashees e Index Ventures, além da investidora-anjo Angela Strange, da a16z, em maio. 

Em julho, a fintech recebeu US$ 1 milhão da Sequoia e em outubro captou US$ 35 milhões na Série A liderada pela Tiger Global. Ao LABS, Irigoyen disse que o investimento veio “naturalmente”, como parte do interesse dos investidores, que foi quatro vezes maior do que o que a rodada suportava. 

LEIA TAMBÉM: As 10 startups mais valiosas da América Latina (até agora)

Se por um lado os investimentos de estágio inicial têm cheques cada vez maiores, por outro o ciclo de investimento está cada vez menos espaçado. “No passado, a gente via um ciclo de 24 meses entre rodadas, entre Seed e Série A”, disse Nicklas. “Você captava alguns milhões de dólares, usava isso para crescer por 18 meses e no mês 17 você saia para captar a próxima rodada, tendo seis meses de espaço para fechar a rodada”. 

Isso, na análise de Nicklas, tem a ver não apenas com o aquecimento do ecossistema, mas também com a geração de valor das empresas, que estão crescendo mais rápido. “Muitas vezes a empresa capta e no mês seis já está no mercado de novo, porque estão conseguindo comprovar o crescimento e os KPIs [indicadores de performance]”, apontou. 

LEIA TAMBÉM: Então é Natal, e o que você fez? Os fundos de capital de risco deram muitos presentes para a América Latina em 2021

“Acho que tem um certo balanceamento nisso. Acontece muito quando tem um modelo lá fora, na China e nos Estados Unidos por exemplo, que já é comprovado. E você tem um empreendedor muito bom no Brasil. Os fundos falam ‘eu já vi essa história, eu conheço essa narrativa e sei para onde essa startup pode ir, então eu estou disposto a valorizar ela agora, sabendo como vai ser o desfecho dessa história’. Mas a gente tenta não fazer isso porque sempre há muitos imprevistos no caminho”, concluiu Nicklas. 

Eduardo Vieira, diretor de comunicação do SoftBank na América Latina. Foto: Divulgação/SoftBank

Eduardo Vieira, diretor de comunicação do SoftBank na América Latina, concorda que os empreendedores de segunda ou terceira viagem, que já têm mais expertise sobre questões estruturais do negócio, estão fazendo as empresas ganharem mais capital. “Por exemplo, começam com times mais experientes, não demoram seis meses para montar um C-level e precisam de mais dinheiro”, disse. 

Vieira também acredita que os investimentos feitos nas empresas early-stage “têm tido uma velocidade bastante fora do comum”. 

Mesmo em um mercado em que a agilidade é fundamental, tem-se visto muitas rodadas, há um certo exagero. Obviamente existe muito capital disponível para investir nas startups. Mas, em alguns casos, elas ainda não desenvolveram seus produtos e, portanto, não têm as melhores condições para ganhar escala.

Eduardo Vieira, diretor de comunicação do SoftBank na América Latina

Um outro ponto para essa aceleração de rodadas, segundo Vieira, está na inflação global de salários. Ele explica que com o aumento da competitividade devido à pandemia, os talentos começaram a ser disputados, não importando a localização geográfica.

“De qualquer maneira, esse é um fenômeno característico da atual conjuntura. Como o SoftBank possui um compromisso de longo prazo, não nos preocupamos tanto, apesar de enxergar alguns exageros”. 

Keywords