O varejo talvez tenha sido o setor da economia que mais sofreu com o avanço da tecnologia nas duas últimas décadas. Apostando pesado no e-commerce como uma tendência natural do acesso à internet e a dispositivos inteligentes, novos protagonistas globais surgiram e tomaram o lugar de boa parte das empresas centenárias, que antes reinavam absolutas no bom e velho modelo de vendas físicas. Como qualquer selva que se preze, no entanto, alguns dos players mais experientes do setor conseguiram ler esse fenômeno a tempo, se adaptar e sobreviver – mesmo em uma região com altos e baixos que desafiam qualquer empresário, como a América Latina.
Um desses sobreviventes é o grupo Carrefour. A rede francesa chegou ao Brasil em 1975 e está hoje em plena expansão. Como poucos de seus concorrentes, vem investindo em novas tecnologias e agilidade de atendimento, tanto com soluções próprias quanto também por meio de parcerias estratégicas.
São mais de 650 pontos de venda no Brasil, dos mais variados tipos: de pequenos mercados (como o Carrefour Express), passando por postos de combustível e atacados de autosserviço, aos hipermercados, as grandes lojas que mais servem de referência para os brasileiros quando eles pensam na marca Carrefour. São mais de 100 nesse último modelo no país. Na América Latina, além do Brasil, atua também na Argentina.
Em 2017, a empresa passou a ser uma das 20 maiores empresas listadas na B3, a bolsa Brasileira. Já no ano seguinte, o Carrefour faturou R$ 56,3 bilhões. Foi, literalmente, a grande empresa que mais gerou receitas em 2018, seguida pelo Grupo Pão de Açúcar (R$ 53,6 bilhões), a Via Varejo (R$ 30,5 bilhões) e o Walmart (R$ 23 bilhões), segundo o ranking do Instituto Brasileiro de Executivos do Varejo (Ibevar) em parceria com a Fundação Instituto de Administração (FIA), divulgado nesta quinta-feira (22).
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O bom resultado vem de uma série de mudanças pensadas a partir das mudanças de comportamento do consumidor brasileiro e que acabaram por dar início a uma nova frente de negócios no grupo, o Carrefour eBusiness Brasil.
Neste ano, assim como em 2018, o Carrefour vai investir cerca de R$ 1,9 bilhão no Brasil, com foco, principalmente, na evolução tecnológica do seu negócio. Os novos planos envolvem o desenvolvimento de três competências: a de dados, conteúdo e serviços (o Carrefour quer conhecer seu consumidor a fundo e pensar em novos produtos e serviços a partir disso); a de last mile, que é a expressão usada para a etapa final da experiência eletrônica, que é a entrega do produto (isso em parceria com a startup Rappi); e a de pagamentos digitais (a nova corrida dos varejistas pelo super app e pela presença maior no dia a dia dos clientes).
“A ideia do eBusiness é tornar o Carrefour referência em omnicanalidade e líder no e-commerce alimentar”, disse o grupo em comunicado enviado ao LABS.
Como três vertentes do “novo Carrefour” já ganharam a atenção dos consumidores
Olhando para as iniciativas do Carrefour em 2019, ao lado do alto investimento em tecnologia, nota-se um foco no aumento de canais pelos quais seus clientes conseguem consumir.
Nesse sentido, três vertentes já ganharam a atenção do consumidor brasileiro nos últimos meses.
A primeira delas é a parceira com o aplicativo de delivery Rappi. Criado no Colômbia, o serviço – também será personagem desta série de Desbravadores da América Latina do LABS – tem no Brasil o seu maior polo de clientes e anunciou o trabalho em conjunto com o grupo francês no início de 2019.
Já no primeiro trimestre deste ano, as vendas do Carrefour via e-commerce, seja via site ou aplicativos, cresceram 84%. Também neste ano, um novo serviço de bebidas geladas, 24 horas, foi anunciado, levando em conta o tipo de consumo específico dos clientes brasileiro.
A segunda vertente de 2019, e que pode ser encontrada em poucas cidades do país, são os mercados Click & Retire. Comum em várias redes de varejo nos Estados Unidos, essa funcionalidade chegou no Brasil há pouco tempo e já tem no Carrefour um de seus mais eficientes adeptos.
Segundo a empresa, até o fim de 2019, mais de 100 lojas devem ganhar o novo serviço, que se encaixa como uma luva na estratégia multicanalidade da rede. Também neste ano, o Carrefour pretende implantar a opção “Retire de Carro” em 13 unidades próprias e em mais de 2.000 sellers (comerciantes que participam do marketplace do grupo).
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O Carrefour também quer implantar 1,9 milhão de Stock Keeping Units (SKUs) em seu marketplace eletrônico. O termo SKU se refere a ter um código para cada item em estoque, algo fundamental o controle de armazenagem nessa nova escala de multicanalidade com que o grupo está passando a trabalhar.
A terceira e última vertente de investimento neste ano está relacionada, justamente, às mais variadas formas de comprar que a marca já oferece: um perfil unificado do cliente, o chamado projeto One Carrefour.
Segundo a companhia, ele existe com “objetivo de ter uma visão única dos clientes do grupo, independentemente do formato de interação, além de dar acesso a todos os serviços por meio de qualquer canal de relacionamento”. Hoje, são mais de 13 milhões de cadastros na plataforma Meu Carrefour.
Carina, a IA de 42 anos de idade
A forma de regionalizar e personalizar o próprio serviço, ao lado das iniciativas anteriores, ganhou literalmente vida com Carina, a Inteligência Artificial que o Carrefour lançou no início do último trimestre, seguindo a tendência de assistentes virtuais que ajudam o consumidor a entender qual a melhor forma de interagir com um serviço.
Diferentemente, porém, das empresas de telecomunicação ou dos bancos, o Carrefour apostou em um visual mais maduro para a sua IA. Carina tem 42 anos. Ainda assim, ela atende os consumidores via chatbot e WhatsApp, o aplicativo de troca de mensagens favorito do brasileiro – sensibilidade para entender as características de cada país ou região onde atua é fundamental para o sucesso global do grupo.
Os resultados desses investimentos já estão aparecendo. De abril a junho deste ano, o Carrefour registrou lucro líquido de R$ 419 milhões, 11% a mais do que no mesmo período do ano passado.
Já as vendas brutas somaram R$ 15,3 bilhões, uma alta de 12,9% sobre o segundo trimestre de 2018. Embora as operações do Atacadão, marca de vendas por atacado da rede, tenham sido responsáveis pela maior fatia desse crescimento, houve uma alta de mais de 9% nas vendas realizadas dentro “da mesma loja”. Isso quer dizer que, no geral, todos os modelos do Carrefour estão crescendo e isso se deve também aos investimento nas três competências citadas lá no início do texto.
Com bons resultados também no primeiro trimestre, 2019 promete ser um novo ano de faturamento recorde para o grupo no Brasil.