Do campo até as prateleiras de um supermercado ou buffet de um restaurante, os alimentos passam por uma longa cadeia de suprimento marcada por ineficiências logísticas e tecnológicas. Com a proposta de aportar eficiência na gestão dessa cadeia e, ao mesmo tempo, ajudar pequenos produtores rurais a conectar com restaurantes e varejistas da cidade e tornar o processo de compra e venda mais vantajoso para as duas pontas, a Clicampo garantiu uma injeção de R$ 40 milhões em rodada liderada pelos fundos Valor Capital Group e MAYA Capital para expandir sua tecnologia.
Fundada no início de 2021, a Clicampo é fruto da experiência pessoal do CEO da agtech, Victor Bernardino: enquanto seu pai cresceu na agricultura familiar, sua mãe atuou no segmento de restaurantes por quase 30 anos. Conhecendo as dificuldades e ineficiências da cadeia de suprimento de alimentos enfrentadas por quem vende e por quem compra, Bernardino decidiu construir uma solução que atendesse a ambos. Completam o time de fundadores da agtech José Miguel Noblecilla (CTO), Bruno Mengatti (COO), Luiza Batista (Marketing e Vendas) e Yuri Janotti (Produto).

A Clicampo funciona como uma espécie de central de abastecimento (CEASA, na sigla comumente utilizada no Brasil para designar centrais de abastecimento e comercialização de produtos da hortifruticultura em uma determinada região ou cidade): a startup compra os produtos frescos de uma rede de produtores rurais parceiros, armazena esses itens em galpões próprios e assume todas as etapas de venda e precificação, pagamento, picking e packing e entrega até o dia seguinte para os restaurantes e varejistas.
A interface da Clicampo tanto com os produtores rurais quanto com os restaurantes e varejistas é o WhatsApp. É por lá que quem quer vender faz um cadastro e informa quais produtos tem disponíveis, e quem quer comprar acessa o catálogo e faz o pedido, podendo customizar maturação, embalagem e qualidade dos produtos de acordo com a necessidade do comprador (por exemplo, é possível pedir um quilo de tomates verdes ou uma embalagem com seis unidades de tomates maduros). Segundo Bernardino explicou em entrevista ao LABS, a startup optou por um canal de venda simples e intuitivo como o WhatApp para dialogar e tornar o serviço acessível a um público com baixo grau de digitalização, principalmente entre uma parcela dos produtores rurais parceiros.
“A Clicampo está criando uma plataforma com tecnologia e logística de ponta a ponta para ser o principal canal de escoamento do pequeno e médio produtor para restaurantes e varejistas. Onde houver demanda por alimentos frescos, nós acreditamos que podemos ajudar. Nós fazemos justamente o match entre o produto certo, no preço certo para o cliente certo e oferecemos um serviço mais conveniente, com um preço mais atrativo do que o encontrado em outros distribuidores”, disse Bernardino.
Com essa proposta de valor, a startup mira um público alvo de mais de 4 milhões de pequenos produtores rurais que dispõem de pouca tecnologia e infraestrutura logística para escoar sua produção e manter margens saudáveis de lucro. Segundo a Clicampo, enquanto na cadeia de suprimento tradicional o quilo do tomate que sai da fazenda por R$ 2 e chega ao varejo por R$ 15 em função das ineficiências da cadeia, com seu modelo sem intermediários a startup consegue remunerar o produtor até três vezes melhor do que o mercado e gerar uma economia de até 40% para o restaurante e o varejista.
Nosso modelo de negócio é o chamado 40-40: 40% a mais para quem produz e 40% a menos para quem compra. A ideia é ser um motor de reprecificação do mercado, fazendo com que o alimento fique mais barato para quem compra, mas garantindo uma remuneração justa para quem produz.
Victor Bernardino, CEO da Clicampo
Com pouco mais de um ano no mercado, a Clicampo não revela números absolutos de sua operação, como faturamento ou base de produtores rurais parceiros e de clientes (os fundadores falam em algumas centenas de produtores e quase mil clientes), mas afirma registar um crescimento de 40% mês a mês.
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Um dos pólos produtores em que a startup atua é na região de Brumadinho, Minas Gerais. Por lá, a Clicampo ajuda trabalhadores impactados pela queda da barragem em 2019. Em parceria com o projeto Superação Brumadinho, ação conduzida pelo Sistema FAEMG/SENAR/INAES e o Sindicato Rural junto aos agricultores locais, e o NovoAgro, a empresa construiu a ponte logística para comercializar os produtos da região com os clientes da plataforma. A expectativa é de impactar até 300 pequenos produtores afetados pelo desastre, permitindo um crescimento de até 40% em sua renda familiar.
Com o investimento recebido, a Clicampo quer expandir sua área de atuação para outras comunidades e encerrar o ano comercializando em média 3.000 toneladas de alimentos frescos por mês. O capital também será usado para reforço do time de colaboradores, hoje composto por 70 pessoas focadas majoritariamente em engenharia e produto, e aumentar a demanda junto a novos segmentos de venda, como pequenos varejistas, grandes cadeias de restaurantes e startups de e-groceries.
Segundo Michael Nicklas, sócio do Valor Capital Group, e Monica Saggioro, sócia da MAYA Capital, a Clicampo construiu um modelo de negócio que resolve ineficiências que prejudicam as duas pontas de uma das maiores cadeias de suprimento do Brasil.
“Encontrar fornecedores com o padrão de qualidade requerido e com processo de entrega eficiente é uma grande dificuldade desse setor. A Clicampo não só facilita o processo de supply dos restaurantes, como também gera renda extra para produtores rurais”, disse Saggioro. “A Clicampo também representa uma missão de desenvolvimento econômico e social que acreditamos, e o envolvimento em comunidades como Brumadinho só reforçam os valores do fundador e de todo o time”, acrescentou Nicklas.