Alex Boccara e Gaspard Hambückers, os fundadores da startup argentina Kitchenita. Foto: Divulgação/Kitchenita.
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Criar restaurantes virtuais de sucesso a partir da demanda e das críticas na web: essa é a ideia por traz da argentina Kitchenita

Usando dark kitchens próprias e também cocriando e cogerenciando franquias digitais em cozinhas tradicionais, a startup criada por dois jovens europeus já tem 26 marcas em seu portfólio

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Criada em 2019 por dois empreendedores europeus – Alex Boccara e Gaspard Hambückers – em Buenos Aires, Argentina, a Kitchenita tem hoje 26 restaurantes virtuais na América Latina e na Espanha em seu portfólio. A startup nasceu da frustração dos dois empreendedores com os restaurantes tradicionais e sua aparente incapacidade de se adaptar ao ambiente online. Com base em dados disponíveis publicamente na internet, como avaliações no Google ou a pontuação dos restaurantes nos aplicativos de entrega, eles prometem criar espaços virtuais adaptados às necessidades de cada local, mapeando áreas das cidades para identificar o que os clientes querem comer, onde, como e a que preço.

A Kitchenita recebeu seu primeiro aporte, uma rodada seed, em janeiro de 2020. Foram US$ 500 mil que permitiram que a startup iniciasse suas operações, lançasse suas primeiras marcas e estruturasse sua plataforma. “Percebemos que a maioria dos restaurantes estava (e ainda está) apenas replicando sua oferta offline no mundo digital, o que significa uma operação também off-line, sem processos digitais e, portanto, uma experiência digital ruim para os clientes”, contou Gaspard ao LABS.

“Eram tempos pré-pandemia. Três meses antes do lockdown [e da chegada da COVID-19] em Buenos Aires, construímos a primeira dark kitchen da cidade em parceria com a Rappi. Dois meses depois, percebemos que com US$ 500 mil não construiríamos muitas delas, então começamos a nos concentrar na criação de restaurantes exclusivamente para as plataformas de delivery. Foi quando a pandemia chegou. Vimos a demanda da Rappi e das demais plataformas de entrega disparar – assim como a experiência do usuário piorando muito. Tivemos, então, de mudar nossa abordagem de novo.”

O que Alex e Gaspard viram foi uma saturação de oferta em algumas partes da cidade, enquanto outras regiões não ofereciam nenhuma opção de algumas categorias. “Vimos que nossa abordagem deveria ser ainda mais orientada por dados. Foi quando Leo Lucianna, nosso CTO, e a equipe dele se juntou a nós e nos ajudou a criar nossa operação baseada em dados. Começamos a olhar não apenas para o que e onde era oferecido, mas também para o que as pessoas estavam procurando – e como elas gostariam que fosse oferecido”, disse Gaspard.

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A Kitchenita faz isso por meio de 75.000 bots (aplicações que vasculham a internet, imitando um comportamento humano, mas com foco específico e em grande escala), buscando diferentes fontes de informação pública a cada minuto — o que, segundo Gaspard, dá à startup uma precisão de 70% a 80% sobre o quão alta é a demanda por determinado produto ou serviço.

Ao longo de 2020 e no primeiro semestre de 2021, a Kitchenita expandiu para o Chile (Santiago), Colômbia (Bogotá) e Espanha (tem uma franquia lá), criando mais de 50 restaurantes virtuais. Mais da metade deles não existe mais. É que a startup não está realmente ‘apegada’ às marcas que cria. Se funcionarem, ótimo; se não, a empresa sabe que tem de seguir em frente.

Usando dark kitchens próprias e também co-criando e co-gerenciando franquias digitais em cozinhas tradicionais com espaço ocioso, a Kitchenita tira proveito da redução de custos desse modelo ao mesmo tempo em que testa, sem dó nem piedade, o que pode dar certo.

No ano passado, a Kitchenita atingiu um faturamento de US$ 1 milhão. Também validou seu modelo de franquia digital, que administra unidades digitais de cozinhas offline tradicionais na Argentina. Lá, a startup opera franquias em Buenos Aires e Córdoba, atendendo 35 mil pedidos mensais em ambas as cidades e com um faturamento mensal de US$ 150 mil. Nos últimos meses, também assinou com cinco novos franqueados em Santiago e dois em Bogotá.

Uma das dark kitchens da Kitchenita em Buenos Aires. Foto: Lucía Merle/Divulgação

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A “fábrica” de marcas de delivery da Kitchenita só funcionou até agora porque a startup faz isso ao lado de chefs e cozinheiros talentosos. A startup possui um ‘food lab’, onde cria e testa os conceitos de alimentos inspirados nos dados que coleta (faixa de preço, ingredientes mais usados ​​e outras informações sobre uma categoria específica de alimentos).

“Esta etapa do processo custa cerca de US$ 500. Depois de um mês testando o conceito criado pelo nosso laboratório, decidimos se vale a pena continuar ou não, ou seja, se vale a pena consolidar a marca. Ultimamente, também começamos a trazer os líderes do setor de CPG [sigla para Consumer Packaged Goods, que inclui indústrias de alimentos, bebidas e outras] para testar conceitos conosco, pois também faz todo o sentido que eles o façam, não apenas do ponto de vista do marketing, mas da experiência do cliente com os produtos deles. No fim das contas, o que fazemos hoje é cocriar marcas com chefs e outras marcas, como Stella Artois, AB InBev e NotCo, para citar algumas”, resumiu Gaspard.

Essa ideia de cocriação também motivou a Kitchenita a buscar restaurantes, dark kitchens e empreendedores do setor de alimentação como um todo como parceiros. “Existem mais de 2 milhões de cozinhas na América Latina, muitas delas com capacidade ociosa, então por que sair e construir novas cozinhas?”.

Em março, Kitchenita garantiu sua pré-Série A, de US$ 3 milhões, com fundos como FJ Labs, Unpopular VC, Newtopia, Flambeau Ventures, Magma Partners e Xochi Ventures.

A Kitchenita está usando o novo aporte para preparar sua estreia na Cidade do México e em Lima (Peru) em julho e outubro, respectivamente. Com isso, até o fim de 2022, espera ter 30 marcas próprias em seu portfólio, além de 200 franqueados na Argentina, Chile, Colômbia, México e Peru.

“Lançaremos no próximo mês nossa primeira marca com um chef de renome (um dos 50 melhores da América Latina) na Colômbia. Será um restaurante de comida caseira, comfort food. Em paralelo, teremos também outro lançamento, de conceito vegano, em parceira com um influenciador e chef no Chile”, disse Gaspard ao LABS, acrescentando que o estreia no México, prevista para julho, virá com o lançamento de pelo menos quatro marcas. Segundo ele, o Brasil também está nos planos da startup. “Mas sabemos que precisaremos levantar novos recursos para entrar em um mercado como o brasileiro”.