Marcelle Paiva, COO da Oracle no Brasil. Foto: Divulgação/Oracle
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Para COO da Oracle Brasil, união entre transformação cultural e digital é o motor de crescimento da operação no país

Devido à pandemia de COVID-19, 20% do faturamento dos serviços de nuvem da Oracle Brasil já vêm de PMEs. Em entrevista exclusiva ao LABS, Marcelle Paiva compartilhou suas perspectivas sobre a operação brasileira da gigante da tecnologia e sua jornada pessoal como líder

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Há quase seis anos em cargos de liderança no marketing da Oracle Brasil, Marcelle Paiva ocupa, há um ano, a posição de Chief Operating Officer na multinacional norte-americana. A empresa que completa neste mês 44 anos de existência é uma das maiores companhias de tecnologia do mundo, faturou US$ 10,1 bilhões no quarto trimestre de 2020 (último resultado disponível), sendo US$ 7,3 bilhões oriundos de serviços em nuvem e suporte de licença.

“Fui promovida à COO em meio à pandemia e foi uma mudança bem grande: passei toda a minha carreira na área de marketing”, diz Paiva, em entrevista exclusiva ao LABS. “O desafio era construir a minha própria carreira [na nova posição] e, ao mesmo tempo, construir uma área relativamente nova, que existe há dois anos e meio dentro da organização”, resume a executiva.

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Paiva conta que a operação no País passou por uma grande transformação cultural que vem posicionando a empresa como parceira estratégica de seus clientes, não mais uma mera prestadora de serviços. Somado a isso, a Oracle vem se beneficiando do aumento na demanda por infraestrutura em nuvem, movimento trazido pela transformação digital forçada pela pandemia de COVID-19. Hoje, revela a executiva, 20% do faturamento dos serviços de nuvem da operação brasileira já vêm de pequenas e médias empresas.

“Em um momento em que as empresas estão olhando para redução de custos, olhando como vão ser mais eficazes, a operação em nuvem traz essa democratização. Ela tem baixo custo, você paga pelo que usa e consegue ter respostas muito rápidas. A Oracle acabou tendo bastante adesão no mercado com essas soluções: infraestrutura na nuvem, porque todo mundo precisa hospedar [tecnologia] e democratizar muito mais rapidamente a informação; e a parte de negócios, ERP [sistema de gestão integrada, na sigla em inglês] e customer experience“, relata a executiva.

Mas se a dita transformação digital abriu uma nova camada de oportunidades para a Oracle, também trouxe desafios. “Somos uma empresa de quarenta anos, então também passamos por essa transformação junto com o cliente”, pontua. Em março, a Oracle Brasil anunciou uma parceria com a Azure, da Microsoft, para a migração integral dos datacenters da TIM, primeira operadora brasileira a tomar essa decisão. “Nos unimos com a Microsoft, que poderia ser um concorrente, e fizemos a parceria para prover para o cliente uma nuvem pública híbrida entre Oracle e Azure. Isso é inovação aberta, é o que o mercado busca. A TIM vai ter o melhor das duas empresas provendo o que ela precisa”. 

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Além da parceria com a Microsoft, a empresa criou o Oracle for Startups, programa de inovação aberta com mais de duzentas startups brasileiras. Ao LABS, Paiva falou sobre onde a transformação digital da Oracle encontra a cultural, e compartilhou um pouco da sua jornada pessoal como líder e mentora. Confira os principais trechos da entrevista abaixo:

Anna Lima: A empresa divulgou que as receitas trimestrais totais aumentaram 3% ano a ano, para US$ 10,1 bilhões no quarto trimestre de 2020 [terceiro trimestre fiscal de 2020]. Como foi a performance da operação brasileira nesse cenário?

Marcelle Paiva: A operação do Brasil, sob a liderança do Rodrigo Galvão [presidente da Oracle no Brasil], passou por uma grande transformação cultural, mas também como usamos nosso portfólio de tecnologia – que aumentou, somos um forte player hoje de cloud –, como levamos toda essa inovação ao cliente. Em um momento em que as empresas estão olhando para redução de custos, olhando como vão ser mais eficazes para vender suas operações, principalmente hoje em dia, no digital, a operação em nuvem traz essa democratização. Ela tem baixo custo, você paga pelo que usa e consegue ter respostas muito rápidas. A empresa passou a ter um modelo de atuação com o cliente muito voltado a parcerias estratégicas, em que se acompanha o negócio do cliente para propor essas soluções.

Acabamos tendo bastante adesão no mercado com infraestrutura na nuvem, porque todo mundo precisa hospedar [sua tecnologia], democratizar muito mais rapidamente a informação, e com a parte de negócios, ERP [sistema de gestão integrada] e customer experience; com toda a parte de como melhorar a jornada dos nossos clientes, entender o que ele precisa para vender mais, como manter essa operação saudável, com inovação, totalmente no digital. 

Somos uma empresa de quarenta anos, então também passamos por essa transformação junto com o cliente, entendendo o que é estar em um momento e vir com ele para outro. Fizemos a nossa lição de casa, tanto culturalmente, quanto em termos de tecnologia, e acho que estamos colhendo bons frutos por isso, por conseguir unir as duas coisas.

Um exemplo é a TIM, um cliente de muito tempo que vem acompanhando toda a nossa transformação e vem também adquirindo tecnologias, se modernizando. Nos unimos com a Microsoft, que poderia ser um concorrente, e fizemos a parceria para prover para o cliente uma nuvem pública híbrida entre Oracle e Azure. Isso é inovação aberta, é o que o mercado busca. A TIM vai ter o melhor das duas empresas provendo o que ela precisa. Essa parceria vai ajudar a empresa a obter mais performance. Nuvem híbrida – poder contar com vários players na sua operação para garantir a melhor performance –  é para onde o mercado caminha em termos de inovação.

Essas parcerias e a forma de olhar o cliente, é onde a Oracle vem se transformando. A inovação aberta é muito importante para nós: assim como fizemos com a Microsoft, temos casos com startups, que a gente aporta para o cliente: vamos juntos com essa startup para que você realmente tenha essa funcionalidade, esse diferencial no mercado.

Sentimos forte movimento em SMB [pequenos e médios negócios, na sigla em inglês]: 20% do nosso faturamento em nuvem já vem dessa categoria. Justamente porque a nuvem tem um custo de acordo com a necessidade, você vai pagar pelo uso, pelo seu ambiente, não por usuário, em que o custo ficava mais elevado e você tinha de levar o maquinário completo para a empresa. Agora você paga pelo serviço. 

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A SkyOne é uma startup com um modelo de negócio em que sua tecnologia é transacionada na nossa infraestrutura na nuvem, então toda vez que ela vende a tecnologia, por ser hospedada na Oracle, ela ganha, cresce, e aí consome mais a nossa nuvem – e também ganhamos. Conseguimos equilibrar bem esses modelos ganha-ganha. Temos modelos de negócios que permitem isso, desde uma parceria estratégica no Brasil com um player como a Microsoft, até um modelo com a SkyOne, que é um SMB, em que as duas empresas ganham.

Também temos um programa chamado Oracle for Startups, com aproximadamente 200 startups. Fornecemos, de entrada, créditos na nossa infraestrutura na nuvem e não tomamos equity de nenhuma empresa. É um trabalho em que damos esses créditos, mentorias e fazemos a conexão com nossos clientes. Às vezes, só vamos apresentar o cliente à startup e eles vão seguir sozinhos; ou em outras, vamos compor com a nossa solução. Customizamos estratégias para oferecer o que o nosso cliente precisa entre uma startup, um modelo de negócio. Parte da transformação cultural que o Rodrigo promoveu foi desenvolver um trabalho com essas startups, que culmina em inovação aberta. 

AL: Em quais setores acredita que os cloud services mais terão penetração nos próximos anos?

MP: Todos os setores e portes de empresas se beneficiam, mas onde acho que vamos acelerar muito, no caso da Oracle, é em telecomunicações, varejo, serviços financeiros e manufatura, porque se começou a olhar muito para as operações logísticas, para a necessidade de ter um ERP moderno, em nuvem, e isso começa a ser uma questão bem estratégica. Educação também está se transformando muito pela pandemia, então a tecnologia auxilia muito para que existam novos modelos de negócios e novos formatos nesse setor.

AL: Com quase seis anos de Oracle e há um ano como COO, quais são os desafios dessa nova etapa da carreira?

MP: Fui promovida à COO em meio à pandemia, quando fui convidada para assumir esse novo desafio. Foi uma mudança bem grande, já que passei toda a minha carreira na área de marketing. Durante minha carreira, sempre trabalhei dentro da mesma área e propósito, de encantar o cliente, comunicar bem as nossas soluções, atender geração de demanda. E aí surgiu esse convite, após três meses de pandemia e em meio ao home office, para vir para uma área de operações, que tem algumas características a ver com a minha formação, mas outras não. Claro que dá aquele medo. 

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O desafio era construir a minha própria carreira [na nova posição] e, ao mesmo tempo, construir uma área recentemente nova, que existe há dois anos e meio dentro da organização.

Apesar de estar em uma área de processos e operações, pensei que a melhor coisa para desenhar os melhores processos, entender melhor os números, seria criar duas redes de apoio [uma externa, com cinquenta mulheres C level de empresas clientes ou potenciais clientes e outra interna, com um programa de mentoria para colaboradoras]. Eu procurava os potenciais clientes, então os primeiros noventa dias foram para me conectar. E pensei: ‘já que eu quero me conectar com os clientes, entender a visão deles para o negócio, por que não fazer isso apenas com mulheres, unindo as duas coisas, negócios e diversidade?’. Como falei, meu lema é muito de inclusão. E foi muito bacana, eu tinha tanto a perspectiva do que é ser mulher em uma carreira C level como a perspectiva de negócios, a visão que elas tinham da Oracle, se conheciam ou não. O material que compilei depois foi muito rico.

AL: Como concilia o atual cargo com a maternidade?

MP: Sou uma pessoa muito dinâmica, gosto de incluir coisas na minha vida. Quando eu tive meu primeiro filho, aos 27 anos, tive o baque de avisar meus gestores, aquela insegurança de ‘será que vou ter meu lugar quando eu voltar?’ Mas alguns desses mitos foram caindo por terra para mim. Desde o meu primeiro filho, eu tive a sorte – e falo isso porque nem todas as mulheres têm essa mesma experiência – de ter uma boa transição, de ter conseguido sair de licença, voltar e isso ter somado na minha vida. Tive meu segundo filho aos 30 anos. Então como eu lido com a maternidade é pela inclusão, não pela exclusão, meus filhos estão acostumados a me ver trabalhando. Tenho esse lema de incluir coisas na minha vida, acho que a maternidade foi uma e eu me alimento muito de coisas pessoais, de organizar rotina. Apesar de eu ter essa energia, sou muito disciplinada com minhas coisas, tenho uma rotina pessoal super forte, de muita disciplina para conseguir incluir várias coisas.

Comecei uma pós-graduação de gestão emocional. Como líder, nessa época de pandemia, senti mais vontade de fazer isso do que me capacitar mais em temas financeiros, que é um aspecto que quem é de marketing acaba tendo de desenvolver melhor. Mas achei que nesse momento do mundo, da conjuntura e da minha função, agregaria mais ao focar nisso. Vivemos em um tempo em que os líderes não são aqueles líderes que só trabalham, porque quem só trabalha, esquece de ver o todo. 

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AL: Como funciona seu programa de mentoria com as colaboradoras da Oracle?

MP: Temos internamente um programa global [de diversidade], com organização própria, metas e estrutura, mas temos um viés muito forte em América Latina e Brasil. Temos uma líder na América Latina que promove diversas ações e encontros. É um programa bastante estruturado para promover a diversidade, mas a diversidade como um todo. Como é que eu, na minha função, com meus conhecimentos e trajetória, poderia agregar a esse programa? Propus um laboratório para organizar algumas mulheres top talents que podem assumir a próxima liderança e faço um programa com elas de mentoria semanal. Estruturei um programa de sete meses em que chamo homens e mulheres, internos e externos. Todos têm que ter um plano de desenvolvimento e contar suas histórias pessoais. Acho que as mulheres têm muita dificuldade de se expor e contar sua história e eu acho que a força do empoderamento está na história pessoal de cada uma. Esse é um pilar. 

Há também um pilar de certificações: queremos essa igualdade, mas também temos que buscar a formação, para quando a oportunidade vir, estarmos preparadas. Tornar as mulheres mais visíveis é outro pilar: como eu aprendo a me tornar mais visível, colocar minha opinião.

O programa começou em janeiro e são trinta mentoradas, de áreas e cargos diversos, inclusive líderes, que, por alguma razão, não estão conseguindo ter uma voz ativa. Em julho vamos finalizar a primeira turma para abraçar outras mulheres e aí quero medir os resultados: quantas mulheres chegaram na liderança, quantas foram promovidas, quantas se tornaram mais visíveis, quantas estão mais protagonistas. Temos algumas métricas para que a gente chegue nesses objetivos. A ideia é conseguir falar com todas as mulheres. Mas para fazer um trabalho de conexão, que é no que eu acredito, não dá para fazer conexão em evento de massa, por isso começamos por grupos.

Na Oracle, temos grupos de mentorias com negros, comunidade LGBT+, PCDs, mulheres, autistas… todos esses grupos têm um líder voluntário da organização, que pode estar ou não em um cargo de liderança. Hoje, discutimos como a carreira dessas pessoas podem ser alavancadas, como elas vão subir [de cargo], como elas também querem participar da liderança. 

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