Quando comunicou a mudança de seu nome de Via Varejo para Via, em abril de 2021, o grupo dono das marcas Casas Bahia e Ponto (ex-Ponto Frio) explicou que a movimentação refletia o rompimento de barreiras entre lojas físicas, sites e aplicativos. Além disso, creditou ao contato com startups parte desse processo de transformação digital.
Atualmente, a companhia atende a mais de 97 milhões de clientes, conta com cerca de mil lojas físicas espalhadas pelo país e tem mais de 100 mil vendedores cadastrados em seu marketplace. Essa última marca foi anunciada na última semana.
LEIA TAMBÉM: Compras remotas via cartões crescem 35,6% no primeiro trimestre de 2021
“Temos um olho no crescimento e na transformação da companhia e outro em novos negócios, novas unidades. E as coisas se complementam, há um pouco de retroalimentação nesse ciclo que estamos criando”, conta o chief digital officer (CDO) da Via, Helisson Lemos, em entrevista ao LABS.
Com passagens por Mercado Livre e Movile, o executivo é um dos responsáveis pela jornada de transformação digital do grupo.
Lemos aponta que o plano de inovação aberta da Via leva em conta o relacionamento com startups em todos os estágios: da contratação como fornecedoras, passando por fusões e aquisições (M&As) até o investimento nessas empresas (CVC).
As startups que interessam mais ao grupo desenvolvem tecnologias dentro das áreas de varejo, logística, serviços financeiros e marketing digital.
Aquisições reforçam o “núcleo duro” da Via: o varejo
Durante a pandemia, o grupo conseguiu manter cerca de 70% de suas vendas graças ao avanço das vendas online. Para manter essa recuperação, a entrada de vendedores terceiros foi essencial, mas a Via não está sozinha na disputa pelo consumidor brasileiro.
Um desses concorrentes é o Magazine Luiza, que fez mais de 20 aquisições desde o começo de 2020 — e desenvolveu soluções financeiras para os vendedores parceiros em seu marketplace. Juntos, os gigantes brasileiros do varejo nacional ainda precisam lidar com a abertura de marketplaces de duas grandes marcas de e-commerce asiáticas, AliExpress e Shopee.
LEIA TAMBÉM: Shopee, de Cingapura, muda o jogo do setor de e-commerce no Brasil
Para se destacar nessa briga, a Via espera reforçar um de seus pilares com a estratégia digital: dar acesso aos consumidores, onde estiverem e com alternativas para pagamento.
Dois exemplos dessa visão na prática são a fintech banQi e a operadora de logística ASAP Log — duas startups adquiridas em 2020.
Com mais de 2 milhões de clientes ativos, o banQi recebeu aval do Banco Central para ser uma Sociedade de Crédito Direto (SCD) em julho, podendo oferecer produtos como crédito pessoal. Até o fim de 2021, a empresa planeja oferecer R$ 300 milhões em empréstimos.
Já a ASAP Log é uma operadora logísitica de última milha, focada na última etapa do processo de transporte de um produto até o consumidor. Segundo Lemos, a logtech já é responsável por 60% das entregas de compras online do grupo.
“Queremos atender a todos. Obviamente, nós temos algumas fortalezas que nos permitem atender ao Brasil inteiro, não apenas às capitais, e um público de renda que nem sempre consegue acesso a crédito via banco ou cartão de crédito”, explica Lemos. Para um dos líderes de inovação da Via, esse posicionamento faz que a companhia cresça em relevância.
O crédito é uma das mais potentes formas de recorrência que existem. Fala-se muito de superapp por conta da recorrência, mas o crédito gera uma relação muito forte com nossa base de consumidores. É uma questão de confiança também
Helisson Lemos, CDO da Via.
Investimentos no futuro ajudam na oxigenação da cultura da Via
Parte dessa estratégia digital também está no investimento em startups. Realizado em parceria com o Distrito, hub de inovação que também recebeu aporte da Via em novembro de 2020, o programa Via Next promete investir até R$ 200 milhões nos próximos cinco anos.
Para Lemos, o investimento em startups tem um viés mais estratégico do que financeiro. Ou seja, o grupo tem valorizado o contato com startups como forma de aprender novas formas de resolver desafios atuais do negócio, como aumentar a receita, e como ferramenta para a descoberta de novos negócios.
Esse ganho cultural nem sempre é fácil de mensurar, mas já deixou a companhia on fire, como brinca o executivo.
As startups têm o poder de oxigenar os executivos e os talentos que temos aqui. O efeito que isso pode ter na aceleração da Via em si pode superar, inúmeras vezes, o potencial de investimento financeiro
Helisson Lemos, CDO da Via.
Esse processo de investimento no futuro já começou. Na primeira semana de setembro, a Via anunciou o investimento nas fintechs GoPublic, Poupa Certo e byebnk. As três estão em estágio inicial de operações e oferecem serviços variados, desde soluções de crédito até educação financeira, passando pela negociação de criptomoedas.
No caso do trio de startups, os aportes foram feitos no formato convertible debt, em que o valor investido entra como um empréstimo que pode ser convertido futuramente em ações. Segundo o responsável pelo projeto Via Next, esses são só os primeiros de muitos investimentos em inovação.
O futuro que Lemos vislumbra é que a companhia vá além de um superapp: “A gente quer ser um ecossistema de varejo e além varejo. Com atividades de varejo e de marketplace, mas também um ecossistema de soluções financeiras, logísticas. [Queremos] que elas funcionem de forma agnóstica, seja para o consumidor final, seja para os parceiros”, afirma.