A startup brasileira Fazenda Futuro lançou recentemente seu terceiro produto a base de plantas: frango. Mais precisamente, pedaços de base vegetal que lembram a textura e o gosto do frango. Esse terceiro lançamento chega junto com um plano ambicioso de iniciar as operações no mercado americano a partir de janeiro de 2021.

Fundada em abril de 2019, a foodtech já recebeu dois aportes. O último, de R$ 115 milhões e liderado pelos fundos BTG Pactual, Turim MFO e ENFINI Investments, avaliou a empresa em R$ 715 milhões e pavimentou o caminho para novos planos de internacionalização – usando outras marcas, como Future Farm e Hacienda Futuro, a startup já está presente no Chile, México, Uruguai, Suécia e Emirados Árabes, por onde envia produtos por meio de distribuidores, e na Holanda, onde tem um escritório próprio.
Em conversa com o LABS, Marcos Leta, fundador da Fazenda Futuro, disse que ainda em 2021 a empresa deve levantar uma nova rodada para escalar o negócio nos Estados Unidos.
O mercado americano anda aquecido para empresas como a Fazenda Futuro. Uma pesquisa de mercado da Polaris publicada no último mês de julho mostrou que o mercado global de carne vegetal foi avaliado em US$ 11,1 bilhões em 2019 e deve crescer 15,8% ao ano até 2027, quando provavelmente será avaliado em US$ 78,3 bilhões.
LEIA TAMBÉM: O negócio que deu certo na pandemia: Liv Up espera crescer 3 vezes em relação a 2019
Por que? Segundo a Polaris, o aumento estaria relacionado ao crescimento da população vegana e dos produtos a base de plantas, à conscientização do consumidor em relação aos benefícios nutricionais de uma dieta com menos proteína animal, e a preocupações com saúde em geral enfatizadas pela pandemia de COVID-19.
No caso da Fazenda Futuro, o público alvo passa longe dos veganos. Segundo Leta, 95% dos consumidores de produtos da startup comem carne, o que, segundo o fundador, pode significar uma mudança no comportamento dos carnívoros: a opção por não comer carne todos os dias.
“A maior categoria de alimentos é a carne e o jeito que ela é produzida é muito antiquada do ponto de vista de sustentabilidade, com sacrifício animal. Nós percebemos que com a população aumentando, com a globalização e o aumento de consumo em certas regiões que antes não consumiam carne, não dá para consumirmos do mesmo jeito. Ficaria insustentável a longo prazo com a população crescendo. A gente não tem um planeta B”, disse Leta.
LEIA TAMBÉM: Fazenda Futuro lança linguiça à base de plantas que imita carne de porco
Para ele, assim como o mercado financeiro e de transportes passaram por uma revolução, a indústria de alimentos está se transformando. “A gente começou pelo maior mercado, o de carne. A ideia da Fazenda Futuro não era concorrer ou ser uma empresa de produtos para veganos. A gente montou a Fazenda Futuro justamente para mudar a maneira como o mundo come carne”, disse.
No Brasil, ainda há um longo caminho para isso. Já no próximo grande mercado da Fazenda Futuro, os Estados Unidos, a indústria de carne convencional está em parafuso e a pandemia da COVID-19 é um dos motivos, segundo a Polaris.
“Devido ao risco de infecção e lockdown sério do país, as fábricas de embalagem de carne nos EUA fecharam. Este fechamento levou à redução em mais de 25% da produção de carne e interrupção no abastecimento de alimentos”, aponta a pesquisa da empresa.
LEIA TAMBÉM: Fazenda Futuro recebe novo aporte e é avaliada em R$ 715 milhões
Com isso, o relatório mostra que produtores de carne a base de vegetais nos Estados Unidos, como a Tyson Foods, Beyond Meats e Impossible Foods cresceram no varejo. E é justamente no varejo que a Fazenda Futuro pretende atacar seus concorrentes por lá. Para lidar com a concorrência, Leta quer reduzir o preço do produto em solo americano. E ele acredita que a Fazenda Futuro tem uma vantagem: os produtos são feitos no Brasil, onde a disponibilidade de insumos é grande, o que torna o produto mais barato.

A seguir, os principais trechos da entrevista de Leta ao LABS
LABS – Como é esse novo produto de frango e como vocês o fizeram?
Como o frango tem uma textura diferente, quando você compara as fibras de uma carne e as fibras de um frango você tem uma mudança significativa no formato. A gente começou a fazer um estudo completo de como a gente conseguiria texturizar os vegetais para que conseguíssemos extrair essas fibras mais longas. O produto é um blend de soja não-transgênica com ervilha não-transgênica, que passa por um processo industrial físico para moldar os vegetais. Então conseguimos extrair essas fibras mais longas.
Depois vem a parte de sabor, tentamos tirar o máximo possível do sabor do vegetal e deixar um sabor mais neutro, próximo do frango, para as pessoas temperarem, fazerem as receitas que gostam mais.
LEIA TAMBÉM: iFood dá passo inicial para empregar drones no delivery de comida
No frango a gente trabalhou para cortar a gordura, replicar e até melhorar a saudabilidade em relação ao frango de origem animal. E conseguimos. De gordura total ele tem quase 6g, o que é muito baixo, e 0g de gordura saturada. Gordura trans não tem.

Além disso, nós escutamos os clientes pedindo para a gente testar novos tipos de embalagem. Estamos fazendo um teste com uma embalagem que usa 53% de “plástico verde” a partir de cana-de-açúcar. Tentamos evoluir também nessa experiência sustentável e saudável completa para os nossos clientes. Esse produto do frango é o mais barato da Fazenda Futuro, com valor de R$ 15 a R$ 16.
Vocês vão começar a operar no mercado americano, certo? Estão contratando pessoas por lá? Lá a concorrência será mais acirrada do que aqui no Brasil, não é?
Já estamos com a empresa nos Estados Unidos e já começamos a contratar as pessoas. Começaremos a mandar produtos em novembro mas não para vender, mas para fazer os testes com o consumidor, organizar as distribuidoras com as quais já temos contrato. A operação mesmo começa em janeiro 2021.
LEIA TAMBÉM: A revolução das foodtechs no mercado da América Latina
O grande desafio da categoria no mundo é diminuir o preço para chegar no valor de uma carne de origem animal. Aí é quando teríamos a migração, quando chegássemos a uma sofisticação na qual o produto é 100% parecido com o de carne e o preço é exatamente igual. Nesse caso não tem porque não mudar, porque entregamos muito mais sustentabilidade e saudabilidade por um preço igual de carne sem matar um animal e sem gastar os recursos naturais que são gastos para produzir um quilo de carne.
Por a gente estar no Brasil e ter as matérias primas disponíveis aqui, a gente consegue ser competitivo em preço. A nossa estratégia nos Estados Unidos é atacar com preço, principalmente no varejo, não no food-service.
Grandes nomes de plant-based tem surgido como a Impossible Foods, avaliada em $4 bilhões, Beyond Meat, que quintuplicou seu valuation desde o IPO no ano passado, e a chilena NotCo. Como você vê esse mercado competitivo?
Eu não considero nenhum plant-based concorrente meu. Quem é meu concorrente é o frigorífico. Nosso foco é cada vez mais deixar os frigoríficos obsoletos, educando o consumidor dos benefícios de plant-based e aumentando em tecnologia para a gente conseguir chegar nesse nível onde a carne vegetal é realmente próximo ou igual a carne de origem animal.
No Brasil é uma categoria nova que basicamente surgiu com o nosso lançamento. Ainda precisa ser construída, temos feito um trabalho comercial de educação no ponto de venda e um trabalho de marketing para explicar o benefício sustentável para o consumidor.
LEIA TAMBÉM: Lista das Top 100 startups de Inteligência Artificial conta com chilena NotCo
Já nos Estados Unidos a categoria já está mais madura, já está em uma outra fase e na Europa está em um momento de transição, do hambúrguer que tem o gosto de feijão, para uma carne plant-based que tem esse sabor similar ao de origem animal.