A fintech brasileira provedora de crédito BizCapital está se preparando para virar umainstituição financeira em 2021, apostando na nova agenda regulatória do Banco Central do Brasil. A empresa, que nasceu em 2016 para fornecer crédito para capital de giro e aquisição de equipamentos para PMEs (Pequenas e Médias Empresas), agora quer ser a principal provedora de soluções financeiras para pequenos empreendedores, lançando diversos produtos para isso. Estratégia similar a da Cora e de uma série de outras fintechs que agora olham para as empresas como o próximo campo de batalha com os bancos no país.
Nesta terça, a BizCapital lançou uma conta digital para pessoas jurídicas, gratuita e sem taxa mensal para os empreendedores, que poderão fazer transferências para clientes ou terceiros sem custos extras, agendar pagamentos e outros serviços financeiros.
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Com o novo produto, as linhas de crédito da BizCapital serão integradas na própria conta digital, o que torna o processo mais ágil. Mas a conta não é só para quem já obteve empréstimo com a fintech. Ela está disponível para todos os pequenos empresários, segundo a startup. Com isso, a fintech pretende criar uma “porta de entrada” para oferecer crédito e, com o tempo, outros serviços.
A ideia da BizCapital é alcançar 120 mil contas até novembro de 2021. Hoje, a startup atende 7.700 empresas e já realizou cerca de 10 mil empréstimos por meio de sua plataforma. Até o início da pandemia, a BizCapital tinha feito 6 mil empréstimos. A fintech tem 95 funcionários e 20 vagas em aberto, com a ambição de se tornar o maior player desse mercado no Brasil.
Complemento da Série B em outubro: R$ 20 milhões de fundo holandês
O desenvolvimento da conta digital era um dos produtos idealizados pela fintech desde que recebeu uma rodada Série B de R$ 65 milhões, em junho, liderada pelo DEG (Deutsche Investitions – und Entwicklungsgesellschaft), braço de investimento internacional do banco de desenvolvimento alemão KfW, em conjunto com o MELI Fund, fundo de corporate VC do Mercado Livre. Em outubro, a BizCapital ainda levantou um valor complementar da Série B, de R$ 20 milhões, pela holandesa Oikocredit, totalizando R$ 85 milhões.
Em conversa com o LABS, o co-fundador da BizCapital Francisco Ferreira disse que a pandemia da COVID-19 teve uma consequência positiva para o negócio da Biz, porque se no início da crise existia uma dúvida sobre o que iria acontecer com os créditos originados via plataforma, agora a pergunta foi respondida: a fintech conseguiu superar a crise econômica. “Não que não tenha ocorrido aumento de inadimplência, mas eu acho que a gente conseguiu passar por essa crise mostrando que o que a gente faz tem bastante consistência em termos de qualidade de portfólio de crédito”, disse.

Segundo ele, a startup está bem capitalizada no momento, com caixa suficiente. Mas as conversas com os investidores são “constantes” e variam de acordo com as oportunidades que surgem. “A gente capta toda vez que vemos que temos um momento bom, sólido, onde a gente vê claramente que se a gente investir vamos trazer retorno”, disse.
Para ele, ter conseguido receber esse valor durante a crise está relacionado ao fato de que o investidor estrangeiro está olhando o Brasil a longo prazo e pensando nas mudanças estruturais que estão acontecendo no mercado, o que faz com que eventuais crises, no horizonte de longo prazo, não mudem a perspectiva.
Segundo Ferreira, ao longo dos próximos 18 meses, a BizCapital deve lançar produtos para solucionar diferentes problemas das pequenas empresas. “No empréstimo você acaba tendo um contato mais ‘episódico’, a empresa pega um crédito, ela paga, pega outro crédito, ela paga. O que a gente quer é estar presente todos os dias na vida da empresa, que todos os dias o cliente esteja usando nossa marca e nossos serviços. E todos esses produtos, conta, cartão, tudo isso vai aproximar mais o cliente da nossa empresa ao longo do tempo e fortalecer o nosso ecossistema”, contou.

Segundo a empresa, o crédito cai na conta do favorecido em um dia útil no máximo, o que, com o PIX integrado na plataforma em breve, ficará ainda mais rápido.
Confira abaixo os principais trechos da entrevista de Francisco Ferreira ao LABS:
LABS – Como a Série B tem sido usada?
Ferreira – Um pedaço do dinheiro a gente usou no processo para nos tornamos uma SCD ( Sociedade de Crédito Direto). Para isso a gente tem todo um trabalho de adequação e de exigências regulatórias e a gente tem se preparado para isso. Para fazer isso temos que ter um capital mínimo requerido pelo Banco Central, então esse é um dos usos, estamos avançando nesse processo.
Nossa ideia ainda no primeiro semestre do ano que vem é nos transformar numa instituição financeira regulada pelo Banco Central. A gente também está desenvolvendo outros produtos, crescemos o time.
Historicamente a Biz sempre foi a plataforma mais ágil do mercado para pequenas empresas conseguirem crédito. E a gente vem acelerando cada vez mais esse processo e introduzindo novas tecnologias para fazer isso ainda mais rápido.
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Desde maio estamos aplicando um processo novo de onboarding totalmente automatizado, protegido contra eventuais fraudes. Ele faz mais checks ainda, e todo o processo pode ser feito sem nenhuma pessoa. Isso agilizou ainda mais o tempo entre o cliente acessar o nosso site e conseguir a liberação do crédito. A gente captura selfie do cliente, verifica por meio de inteligência artificial se a foto confere, fazemos cruzamento de informação de documentos para ver se esses documentos são verdadeiros.
É tecnologia própria da BizCapital para verificar se a pessoa que está tentando tomar o empréstimo realmente faz parte daquela empresa. Isso é uma forma de a gente não só fazer com que o processo seja mais rápido mas seja ainda mais seguro em relação ao que a gente tem hoje.
LABS – Como vai funcionar a integração com o PIX?
Ferreira – A funcionalidade ainda não está ativa mas em breve teremos novidades com o PIX. A nossa ideia é permitir que o cliente pague a fatura da Biz e os empréstimos da plataforma usando o PIX, a gente vai passar a desembolsar também via PIX, isso vai permitir que os empréstimos feitos na plataforma consigam ser mais rápidos e 24/7. Hoje a gente só tem operações nos dias úteis.
Também reduziria custos porque o PIX é mais barato do que os TEDs com que a gente opera hoje. Outro produto em fase de testes é o crédito com garantia de recebíveis de cartão. Ou seja, as empresas que aceitam cartões podem usar esses recebíveis como uma garantia para os nossos empréstimos usando as administradoras.
LABS – Quais as taxas de concessão de crédito da BizCapital?
Ferreira – As nossas taxas são bastante competitivas, mas eu realmente acho que o nosso cliente não procura a gente só porque a taxa é barata. Muitas vezes a gente nem tem a taxa mais barata. Ele procura o nosso serviço porque temos a melhor experiência, é o serviço mais rápido.
As pessoas pensam muito em taxa mas acho que para a pequena empresa ter um parceiro financeiro com que você possa contar é ainda mais importante. Muito da nossa inovação de produto passa por como a gente faz isso o mais rápido para o cliente. Porque no fundo há uma série de exigências regulatórias para fazer qualquer tipo de transação financeira, e você tem que se prevenir de fraudes e resolver o problema do cliente com poucos toques no celular. Essa é a nossa proposta.
Hoje a gente faz linhas de crédito de R$ 5 mil a R$ 200 mil reais com taxas que variam de 1,99% ao mês até 6,49% ao mês dependendo do perfil de crédito da empresa. O prazo de pagamento varia de 6 a 24 meses para pagar.
Para solicitar crédito a empresa tem que ter um faturamento mínimo de R$ 120 mil ao ano e um máximo de R$ 5 milhões ao ano. A empresa também tem que ter pelo menos um ano de existência.
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Para conceder o crédito, a gente avalia as empresas com diversas fontes de dados, criamos nossos modelos de crédito usando mais de mil variáveis diferentes. Muita gente pergunta qual o segredo para tomar crédito. Bom, a gente olha empresas que pagam impostos, que tem fluxo de caixa positivo, que já tem histórico de crédito no mercado, pagam direitos dos funcionários, tudo isso a gente olha, de uma maneira bastante automatizada, é verdade.
Mas essencialmente acho que na nossa visão como empresa, a gente não surgiu para ser um banco ou ser uma financeira, surgimos para ajudar o empreendedor. Por acaso a gente oferece serviços financeiros.
LABS – Como as novas regulações do Banco Central afetam o negócio da BizCapital?
Ferreira – Quando você começa a participar desse mercado e ver tudo que está sendo feito no Banco Central: o PIX, a entrada da convenção das registradoras em fevereiro, que vai melhorar o mercado de crédito baseado em recebíveis de cartão; a duplicata escritural, que é uma coisa para meados no ano que vem; o open banking que no início do ano que vem entra no ar; as SCDs e SEPs (Sociedade de Empréstimo entre Pessoas) que foram novas estruturas mais baratas para se operar com a jurisdição do Banco Central; e mesma a conta de pagamento, que acho que foi uma grande evolução. Essa é mais antiga, mas sofisticou muito; a plataforma de banking as a service, enfim, acho que tem muita coisa.
Quando a gente olha para a frente e vê tudo que tem para acontecer, eu tenho aquele sentimento de que só estamos no começo. A gente não viu nem 1% do que vem por aí.