Equipe de e-sports do Corinthians
Equipe de e-sports do Corinthians, vencedora do Free Fire World Series (FFWS), realizado em novembro. Foto: Divulgação/IGC.
Tecnologia

O fenômeno Free Fire no Brasil

Jogo gratuito criado em Singapura, Free Fire explodiu no Brasil e transformou o país em um mercado-chave para a Garena, dona da marca

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Em 2018, Free Fire foi o aplicativo mais rentável no Brasil, superando nomes conhecidos como Tinder e Netflix. Os dados de 2019 ainda não foram consolidados pela SensorTower, consultoria especializada em lojas de aplicativos, mas não seria arriscado apostar em um bicampeonato do jogo gratuito da Garena. Afinal, se em 2018 Free Fire comeu pelas beiradas para chegar ao topo, em 2019 ele roubou a cena e dominou o cenário de games brasileiro. 

Free Fire é um jogo de tiro do tipo “battle royale”, em que dezenas de jogadores são largados em uma ilha repleta de armas e outros itens. Vence o último sobrevivente.

Free Fire é um jogo de tiro do tipo “battle royale” da Garena. Foto: Divulgação.

A grande sacada, o que o diferencia dos muitos jogos similares disponíveis por aí, é ser mais acessível: enquanto os pioneiros do gênero, Fortnite e PUBG, exigem celulares avançados e caros para rodarem, Free Fire funciona bem em qualquer aparelho intermediário e não consome muitos dados na conexão à internet.

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Além disso, jogar Free Fire não custa nada. A receita vem da venda de itens cosméticos dentro do jogo, lançados com alta frequência, para manter o interesse dos jogadores. Outro aspecto, destaca Fernanda Domingues, CEO da FD Comunicação, empresa especializada em assessorar e promover empresas do setor de games, é que “os itens [no Free Fire] não são tão caros. Quando o jogador está empolgado, ele compra”. Apostando em volume, Free Fire virou uma (prolífica) galinha dos ovos de ouro.

“Sabíamos, por nossa experiência no Sudeste da Ásia, que os jogadores em mercados onde dispositivos móveis estão crescendo gostam de jogos que são mais leves em dados e poder de processamento”, explica Fernando Mazza, head de operações da Garena Brasil. No terceiro trimestre de 2019, o preço médio do smartphone vendido no Brasil foi de R$ 1.165, segundo a IDC, valor distante dos R$ 5 mil que aparelhos topos de linha, como iPhone 11 e Galaxy S10, custam.

Fernando Mazza, head de operações da Garena Brasil. Foto: Divulgação.

Free Fire tinha 450 milhões de jogadores registrados no mundo inteiro em maio de 2019, número mais atual que a Garena revela. Mazza não abre outros números, mas dá pistas que sugerem o crescimento vertiginoso do título e, ao mesmo tempo, a importância do Brasil para a desenvolvedora nesse contexto.

É o caso das competições oficiais. Em 2020, a Liga Brasileira de Free Fire (LBFF) terá três divisões e três etapas ao longo do ano, contando com a participação de times profissionais e de centenas de aspirantes de todo o Brasil. As partidas da série A, a principal, serão presenciais, disputadas no Estúdio 1, dentro do complexo dos Estúdios Quanta, em São Paulo (SP), espaço com mais de 1.200 m², e transmitidas ao vivo via YouTube. “É uma forma de engajar ainda mais nossa comunidade local e trazer conteúdo relevante a nosso público”, diz Mazza. Os jogos da primeira fase da LBFF de 2020 terminam neste domingo (15th), mas com o estádio fechado ao público em razão do coronavirus.

Em novembro, o Free Fire World Series (FFWS), um dos torneios mundiais que a Garena organiza, retorna ao Brasil. A primeira edição aconteceu no Rio de Janeiro, e alguém distraído poderia até achar que se tratava de outra coisa, já que o campeão foi o Corinthians – sim, o mesmo Corinthians do popular time de futebol. 

Equipe de e-sports do Corinthians, vencedora do Free Fire World Series (FFWS), realizado em novembro. Foto: Divulgação.

“O nome Corinthians traz um grande senso de responsabilidade”, diz Fernando Hamuche, do IGC, grupo que tem os direitos da marca Corinthians para e-sports (com exceção dos jogos de futebol virtual). Com menos de seis meses desde a sua criação, a equipe de Free Fire do Corinthians já havia conquistado a LBFF e o FFWS.

Dentre todos os jogos competitivos disponíveis no mercado, a escolha pelo Free Fire para o ponta-pé inicial do Corinthians nos e-sports se deu por alguns fatores além da sua popularidade. “É um jogo novo, em desenvolvimento, e democrático, porque não é somente pelo tamanho do público, mas o tipo – todas as idades, de crianças até famílias inteiras”, elogia Hamuche.

A Garena vem fazendo um trabalho muito bom de organização. Temos a segurança de que Free Fire não será facilmente esquecido. Há investimento

Fernando Hamuche, do IGC, grupo que tem os direitos da marca Corinthians para e-sports.

A equipe de Free Fire do Corinthians foi montada do zero, com profissionais que não jogavam juntos anteriormente. Eles vivem em uma casa na capital paulista e, além do nome do clube de futebol, têm o apoio da Nike via o patrocínio da empresa à equipe de futebol do clube. Em outra amostra de como esses universos, futebol e Free Fire, se misturam, ao inaugurarem a residência dos jogadores de Free Fire, algumas luzes decorativas eram verdes, cor do Palmeiras, grande rival do Corinthians nos gramados. “Recebemos o feedback de torcedores dizendo que na casa de Corinthians não tem verde, aí trocamos por luzes brancas”, relembra, aos risos, Hamuche.

O último passo da Garena para capitalizar ainda mais com Free Fire foi o lançamento de um aplicativo de streaming próprio, o BOOYAH!, para Android e iOS. Mazza explica que ele chega para “complementar e trazer melhores experiências aos jogadores de Free Fire”, permitindo a realização de transmissões ao vivo simultâneas com outras plataformas, um aspecto importante a fim de não causar estranheza com um setor que cresce de maneira quase simbiótica ao dos e-sports, o das plataformas de streaming ao vivo. 

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Os campeonatos oficiais da Garena são transmitidos pelo YouTube e equipes profissionais e streamers/influenciadores do jogo trabalham sob contratos de exclusividade com Twitch e Nimo, por exemplo. “Não planejamos competir diretamente com outras plataformas”, diz o executivo.

Para convencer os milhões de jogadores de Free Fire a darem uma chance ao novo app, a Garena incluiu algumas vantagens exclusivas para quem transmite pelo BOOYAH!, como itens especiais e a capacidade de inserir sua voz dentro do jogo.

A operação brasileira de Free Fire começou a ser montada no final de 2018, indício de que a Sea, conglomerado dono da marca em Cingapura, talvez tenha sido pega de surpresa pelo sucesso do jogo no distante país sul-americano. 

Surpresa ou não, em 2019 foi feito um trabalho intenso para suportar e expandir a popularidade que, antes disso, já era evidente nos muitos memes nas redes sociais e nos milhões de partidas de Free Fire disputadas no Brasil.

Estamos realmente felizes com a adoção em massa que estamos vendo no Brasil e continuaremos melhorando nossos serviços para toda a comunidade local

Fernando Mazza, head de operações da Garena Brasil.

Para a Garena, Free Fire só está começando.