A pandemia não dá sinais de arrefecimento no Brasil, mas um dia viraremos o jogo contra o coronavírus. Quando isso acontecer, espera-se que alguns hábitos criados por esse período tão difícil sejam mantidos. O home office é um dos candidatos mais fortes. Mesmo que os escritórios não sumam, a experiência que estamos tendo agora está validando o trabalho remoto, que deverá ser mais aceito e difundido. E se passaremos mais tempo trabalhando de casa, precisamos ter esta conversa: o notebook é o pior tipo de computador que você pode ter para trabalhar.
Em 2020, a pandemia fez as vendas de PCs terem a maior alta (13,7%) da última década. No mundo todo, foram vendidos 302 milhões de computadores — entre desktops e notebooks. No Brasil o crescimento anual também foi significativo, ainda que mais tímido, de 6%. Ao todo, foram vendidos no país 5 milhões de notebooks e 1,3 milhão de desktops, ou seja, um desktop para cada quatro notebooks, mesmo os portáteis custando mais caro. No quarto trimestre, o preço médio de um desktop por aqui foi de R$ 3.782; o de um notebook, R$ 4.299, diferença de 13,7%. Os dados são da consultoria IDC, que prevê um aumento ainda maior nas vendas globais para 2021.
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Estamos comprando muitos computadores, mas estamos comprando o computador certo?
Atento às tendências, Dan Weil listou no Wall Street Journal uma série de modificações que os notebooks deveriam contemplar para serem ferramentas melhores no home office. Chamou-me a atenção que várias delas já são realidade em outro tipo de computador, o desktop. Lembra dele? O computador que vem em partes separadas, com uma caixa (que é, efetivamente, o computador), teclado, mouse e tela avulsos, tudo interligado por fios (ou não).
Eu entendo as vantagens do notebook. Dá para levá-lo a qualquer lugar (o que é meio inútil no momento), permite trabalhar do sofá, deitado na rede, até no banheiro (porém evite isso, é nojento), e pode ser ressignificado para usos diversos além do trabalho, como virar uma tela para assistir à Netflix. Há vantagens logísticas também: o notebook já vem montado, pronto para usar, é super compacto e mais fácil de entender.
São vantagens relevantes, não me entenda mal, e que justificam sua existência em muitos contextos. Só que essas vantagens não vêm de graça. Pelo contrário, o dono de um notebook paga caro por elas, ainda que nem sempre perceba esse custo oculto. E, dentro de casa, no home office, as vantagens perdem muito do apelo que teriam em outros locais.
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O maior impacto é na saúde. Não importa a maneira como você o use, o notebook sempre fará mal à sua coluna. Sabe aqueles desenhos que ortopedistas adoram mostrar, ensinando a postura correta ao se usar um computador? Eles não funcionam com o notebook. É impossível ter uma boa postura usando um notebook, porque o formato notebook é naturalmente inadequado para o uso por seres humanos. Sim, é legal trabalhar um dia no sofá, outro na mesa do café da esquina, usá-lo em uma mesa minimalista, só com o notebook sobre ela, mas não há coluna que aguente uma rotina dessas.
No home office, por mais inquieto que seja o profissional, o computador adquire um status estacionário. Todos querem ou, no mínimo, podem se beneficiar de um espaço dedicado e ajeitado para esse fim. É aqui que entra em cena o desktop.
Há três benefícios óbvios no uso de um desktop: financeiro, ergonômico e mental. Os valores médios aferidos pela IDC provam o primeiro, mas vou além. Com o dinheiro que sobra, dá para investir numa webcam (ausente em muitos desktops) ou em um monitor maior, por exemplo. Em 2020, o mercado de monitores teve o seu melhor ano da história, com crescimento de 8,3% e 136,6 milhões de unidades vendidas. A depender da faixa de preço dos equipamentos em vista, com a diferença é possível comprar até um tablet intermediário, para ser usado naquelas situações em que o notebook quebrava o galho, como ver vídeos no sofá ou ler o jornal no café da manhã. E com vantagens: o tablet é mais leve, menos desajeitado de segurar e, com frequência, tem uma tela melhor.
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O segundo benefício é o da saúde — a sua coluna agradece. Mesmo que você não fique o dia inteiro na postura correta, as chances de passar mais tempo bem sentado são maiores com acessórios avulsos e uma tela grande na altura dos olhos do que com um notebook que te força a baixar o pescoço para olhar a tela. Lembre-se do desenho dos ortopedistas — absolutamente nenhum deles mostra um notebook, todos exibem teclado e tela avulsos. Não é uma questão de estilo ou preferência estética, acredite.
Por fim, dada a sua natureza estacionária, o desktop fica preso a um local da casa, o que ajuda a manter separados vida e trabalho mesmo quando os dois acontecem debaixo do mesmo teto. Parece bobagem, mas alternar entre os dois modos é uma habilidade essencial para não enlouquecer e qualquer coisa que te auxilie nesse sentido é bem-vinda. O notebook, ao contrário, tem o poder de transformar qualquer espaço em ambiente de trabalho. Sala, cozinha, até banheiro: a combinação entre bateria e antena de Wi-Fi não encontra limites e torna o desligar-se das atribuições profissionais mais difícil.
Se você já está em home office, é bem provável que trabalhe com um notebook — vide as vendas de computadores dos últimos anos. Ainda que minha breve argumentação tenha sido persuasiva e te convencido de que desktops são um negócio melhor, não faz sentido jogar fora ou mesmo trocar um notebook funcional. Existe, nesses casos, uma “terceira via”: converter o notebook em um desktop adquirindo acessórios avulsos.
É o que faço aqui, no meu home office. O notebook, comprado há quase seis anos, num momento em que mobilidade era necessária em minha vida, há dois ganhou a companhia de um bom teclado mecânico, , um mouse ambidestro e um suporte que eleva a tela do notebook à altura dos meus olhos. Saiu um pouco caro, mas é o melhor dos dois mundos — o conforto de um desktop e a mobilidade de um notebook — e pode até ser encarado como um investimento de longo prazo, prevenindo futuras idas ao médico e remédios para dores nas costas que anos a fio de má postura sempre cobram.