“Já procurou alguma vez hotel na internet? Você reparou a quantidade de preços diferentes que o mesmo quarto pode ter? Em vez de perder horas procurando, deixe que o Trivago facilite a sua busca pelo hotel ideal com o melhor preço”. Que atire o primeiro controle remoto quem nunca se deparou com esse texto no comercial de um dos maiores motores de busca e comparadores de preços de hotéis do mundo (também conhecidos por OTAs – Online Travel Agencies). Verdade seja dita: a alemã Trivago, com apenas 13 anos de vida, é um inegável caso de sucesso no segmento turístico e hoteleiro. Afinal, o site facilita a vida de qualquer pessoa ao comparar os preços de mais de 700 mil hotéis e mais de 200 sites de reserva de uma só vez (essa sentença também é familiar). “Basta digitar o lugar para onde quer viajar, escolher as datas de entrada e de saída, e então é só buscar. Simples assim”.
Esse breve passo a passo está no texto do comercial televisivo mais chiclete da marca. Gostando ou não, essa peça publicitária funciona porque explica, didaticamente, o que o serviço faz e como o usuário deve proceder. A alta mobilização e engajamento dos viajantes, advindos de toda a facilidade que a ferramenta oferece (é possível aplicar vários filtros bastante oportunos), estão expressos em números. Segundo a marca, o site recebe mais de 45 milhões de visitas mensais em suas 40 plataformas internacionais, além de integrar mais de 82 milhões de opiniões e 14 milhões de fotos. Para se ter uma ideia, um em cada cinco norte-americanos afirma conhecer ou já ter usado os serviços da empresa. Isso, é claro, sem contar outros gigantes online de acomodações bem conhecidos do público, como Hotéis.com, Booking.com, Expedia, Hotel Urbano e Decolar.com.
Todavia, enquanto essas plataformas são perfeitas para os usuários e consumidores finais, os bastidores guardam uma questão que poucos conhecem. Empresas de serviços de turismo têm o lucro final dos negócios diretamente afetado pelos sites intermediários de venda massiva. Competir com essas plataformas é, sem dúvida, uma das principais dores desse segmento, mesmo que a relação com as OTAs seja inevitável em função do volume de reservas que elas trazem. Aumentar as vendas diretas, então, se torna um desafio marcante para as empresas do setor – com destaque para os hotéis.
Nesse cenário, oferecer preços mais atrativos caso a reserva aconteça de forma direta não é possível graças à paridade tarifária que, independentemente da comissão negociada com cada motor de busca, exige que o valor das diárias precisa ser o mesmo oferecido no site do hotel. Homogeneização em seu sentido mais amplo.
O fato é que essa regulamentação é uma grande objeção, até porque os sites intermediários contam com investimentos pesados em marketing – vide o início desse texto que, certamente, não soou como uma novidade para o leitor. Apesar disso, nem tudo está perdido. São tantas frentes a considerar que, atribuir a um único fator uma eventual impossibilidade de expansão de vendas seria, no mínimo, imaturo. Vamos tomar como exemplo o aquecido mercado turístico da América Latina, no qual se destaca o Brasil como destino preferido, e apresentar algumas soluções para minimizar o atrelamento total aos canais intermediários, de forma a garantir lucros mais independentes através da comercialização direta e, consequentemente, aumentar a margem final.
Assuma o protagonismo
Existe uma relação elementar que precisa ser entendida. Embora o custo de um apartamento seja o mesmo, as reservas intermediadas são sinônimo de receita (o fee cobrado pelos sites não é barato), enquanto as diretas, por sua vez, são sinônimo de lucro. Quer virar o jogo a seu favor? Aceite sem rancor a primeira reserva do cliente através dos sites de busca. Pensar estrategicamente da segunda compra em diante significa oferecer meios de garantir que as reservas posteriores aconteçam diretamente no site do hotel. Aqui, as palavras-chave são relacionamento e fidelidade. É na hospedagem do cliente que a mágica deve acontecer e se transformar em uma experiência marcante para, quando ele decidir voltar, não buscar outra opção senão o hotel já vivenciado.
Não se acomode
A receita atual cumpre a meta? Então não esqueça esse dado: estima-se que o que um hotel paga em comissão a uma OTA por uma única reserva seja equivalente a três reservas feitas diretamente em seu booking engine. Aproveite a base de contatos que os sites de busca acabam por promover, contudo, em hipótese alguma, se acomode. Um hotel que depende integralmente de comissões tão altas está sentenciado a trabalhar para terceiros.
Invista
Ainda que o conceito de luxo seja dinâmico a se mostre em transformação o tempo todo, há algo que nunca muda: o apreço do cliente em se sentir desejado, único e exclusivo. Por isso, aposte em uma presença online que se torne realmente um funil de conversão. Saiba conversar com o cliente. Acredite, o custo em um bom projeto se SEO para atrair visitantes à sua página pode ser similar ao fee cobrado pelos motores de busca. Além disso, pesquise soluções que trabalhem ofertas diferenciadas com base no grau de relação do cliente com o hotel (veja o item a seguir). Essas ferramentas oportunizam a precificação individual e parecem inaugurar um momento de “quebra” na paridade tarifária, batalhando contra a dependência excessiva. E o melhor: de modo legal.
Fidelize e aposte na exclusividade
Esse termo parece batido dentro do conceito, desafios e estratégias do modelo B2C, mas inesgotável na busca pelo sucesso do negócio. Inspire-se em grandes redes mundo afora e inaugure seu próprio clube de members rate, no qual cada participante é tratado como um “sócio” especial. Isso garante a cada um uma série de benefícios e, é claro, um preço mais baixo. Reconheça seu hóspede e venda pelo preço que desejar. Aqui, vale um adendo: não confunda paridade com integridade tarifária, que significa determinar o preço conforme vale seu produto ou serviço (por exemplo, um hotel de luxo nunca praticar preços que concorram com categorias inferiores).
Tenha perspicácia
Os sites intermediários também enfrentam seus problemas, o que só demonstra que não estão com essa bola toda. Há cinco anos (a questão não é nada nova) alguns deles amargaram a perda de contratos importantes com grandes redes hoteleiras na Europa ao forçar a cláusula da paridade nas negociações. Há brechas que permitem, por exemplo, a oferta de vantagens como programas de fidelidade e wi-fi gratuita para hóspedes que reservarem direto no site (exemplos de ações mais agressivas para incentivar a venda direta). Por isso, na hora de assinar o contrato com um intermediário, busque analisar se ele renderá negócios suficientes para fazer valer a pena e esteja bem informado. Se a resposta for não, não tenha medo de desistir. Se for sim, siga em frente, usufrua dos benefícios do modelo, mas não se permita ser “enquadrado”. E não esqueça: uma vez assinado o contrato, cumpra-o integralmente. Os intermediários têm ferramentas poderosas e constantes de gestão e rastreio e são ferrenhos na defesa da paridade, executando punições rigorosas ao hotel que a descumpre (como rebaixamento no ranking, multas e exclusão).
Entenda – e aproveite – as novas regras
Há poucos meses o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) anunciou algumas restrições da cláusula de paridade tarifária de três grandes OTAs com os hotéis, em um acordo de cessação. A partir de então, os intermediários podem exigir a paridade apenas para tarifas disponíveis online. Isso significa que tarifas privadas e canais offline estão liberados (como em uma área privada do site, acessível através de login e senha e, em uma segunda situação, em contato direto com o cliente). Ou seja, caso deseje divulgar aos clientes tarifas especiais e menores do que os buscadores, isso pode ser feito via e-mail, mensageiros instantâneos, balcão de reservas, agências de turismo físicas e canal de atendimento telefônico. A reserva, porém, deve ser realizada de forma offline ou em uma área restrita do site.
Conclusão
Se fôssemos resumir todas essas soluções em uma só, essa seria: entenda a diferença entre custo e valor. Ela está em diferentes aspectos: na experiência de aproximação entre marca e cliente; no contato feito antes mesmo da hospedagem; na capacidade de seguir com a conversa mesmo após o check-out; no investimento; e na capacidade de ser o protagonista de seu próprio negócio, não entregando sua distribuição a terceiros sem obter nada em troca. Mesmo que seja essa uma imposição, uma restrição de mercado, ou mesmo que muitos enxerguem como uma violação ao direito da concorrência (enquanto você leu esse texto os desentendimentos no setor só fizeram aumentar o número de brigas na justiça), sempre há boas e reais saídas.