Economia

Argentinos recorrem às criptomoedas para escapar da inflação que se aproxima de 60%

Penetração das criptomoedas na Argentina já é quase o dobro do que nas duas maiores economias da América Latina, Brasil e México

Na Argentina, criptomoedas avançam enquanto inflação se aproxima de 60%
Crypstation café, em Buenos Aires. Foto: REUTERS/Agustin Marcarian
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No café Crypstation, localizado no centro de Buenos Aires, jovens argentinos tomam seus cafés rodeados de telas com cotações de preços em tempo real de criptomoedas e um enorme neon escrito Bitcoin. A conta, claro, também pode ser paga em dinheiro digital.

A cena é ilustrativa de um movimento crescente: os argentinos estão sendo cada vez mais atraídos pelas criptomoedas para compensar anos de inflação elevada – no momento, próxima a 60% –, dando de ombros diante do recente colapso do mercado de criptomoedas e da difícil experiência de El Salvador com o ativo.

“O ambiente local está pressionando as pessoas a proteger seu capital em criptomoedas e por isso vemos essa aceleração”, disse Mauro Liberman, 39 anos, um dos fundadores do café, que tem como objetivo promover o uso do ativo digital.

“Em toda a América Latina o potencial de crescimento é enorme”, afirmou, acrescentando que a maioria dos usuários locais está comprando cripto como uma forma de economizar. “É uma tendência forte que não vai ceder”.

Um relatório de abril da AMI (Americas Market Intelligence) mostrou que a penetração das criptomoedas na Argentina era de 12%, praticamente o dobro da taxa de penetração no México e do Brasil. A adoção desses ativos digitais na Venezuela hiperinflacionada é ainda maior, de acordo com um relatório recente da Chainalysis.

“Eu perco menos”

O avanço das criptomoedas é sintoma de uma falta de confiança dos argentinos na moeda local: o peso já desvalorizou 14% esse ano em relação ao dólar. Os mecanismos de controle do governo limitando o câmbio a US$ 200 mensais também estão estimulando a adoção do cripto.

A inflação anual subiu para 58% em abril e pode chegar a 70% este ano, uma taxa que torna as criptomoedas atraentes, apesar do recente colapso de moedas estáveis como TerraUSD e Tether, e de o valor do bitcoin cair para um mínimo de 16 meses.

Victor Levrero, 44 anos, especialista em TI em Buenos Aires, investe suas economias extras em stablecoins e bitcoins depois de usar sua cota de US$ 200 para converter pesos em dólares. Ele diz que não se preocupa com economias em pesos a prazo fixo.

“Basicamente, é porque eu perco menos”, disse ele. “Com a inflação argentina entre 60-70%, e prazos fixos pagando 30-35%, simplesmente não funciona”.

Plataformas de criptomoedas locais como Lemon Cash e Buenbit disseram à Reuters que sua base de usuários tinha disparou no último ano. Enquanto isso, o Banco Central argentino alerta repetidamente sobre os riscos de se investir em moedas digitais voláteis.

Sebastian Carsorio, 23, montou uma mina caseira de criptomoedas com peças recicladas de computador. Foto: EUTERS/Agustin Marcarian


Sebastian Carsorio, 23 anos, mora em um bairro pobre de Escobar, fora da capital, e tem pouco a perder. O jovem está procurando sair da pobreza usando uma mina caseira de criptomoedas que ele montou com peças de computador recicladas de seu trabalho.

“Eu consertei as peças e montei em um computador”, disse ele à Reuters em sua casa, onde tinha telas mostrando como a mineração está indo. Ele começou com Ethereum e depois bitcoin – o que lhe permitiu comprar um terreno e voltar para a escola.

“Vou continuar a mineração porque é uma boa maneira de economizar”, disse Carsorio, explicando que ele consegue uma taxa de câmbio para pesos melhor do que conseguiria na rua. “Quando o dinheiro fica escasso, a mineração me salva”.

(Traduzido por LABS)