Tecnologia

Podem faltar mais de 300 mil profissionais digitais no Brasil até 2024, aponta relatório

É a maior lacuna na América Latina. Projeto do Instituto Alpha Lumen e empresas como Stone, Hash, Brex, Vitta, DEVELL e Farfetch, quer ajudar a reduzir esse gap

profissional de tecnologia trabalhando
Foto: Shutterstock.
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O Brasil possui a maior lacuna quantitativa de profissionais digitais na América Latina. Isso é o que aponta o relatório Como o Brasil pode fomentar um ecossistema de profissionais digitais?, elaborado pela Fundação Brava e o BrazilLAB, hub de inovação que conecta empreendedores ao poder público, em parceria com o Centre for Public Impact (CPI), uma organização social do Boston Consulting Group, divulgado nesta sexta-feira (6).

O relatório parte de dados do IDC em 2016, que previam que em 2019 o gap de profissionais digitais no Brasil seria de 161 mil, e de números do ano passado da Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), que apontam para a criação de 420 mil novos postos de trabalho na área até 2024, para traçar um cenário nada animador. O Brasil precisará de mais de 70 mil profissionais por ano, mas só consegue formar 46 mil, tanto em instituições públicas ou privadas.

A pesquisa conta com o apoio da Alpha EdTech, uma startup social que foi lançada nesta sexta-feira (6) pelo Instituto Alpha Lumen, com o apoio da Fundação Brava, a Fundação Behring e André Street, co-fundador e presidente do Conselho da Stone.

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“Caso não sejam realizadas ações urgentes para ampliar o número de profissionais nos próximos anos, o gap de 161 mil deve continuar crescendo a uma taxa de 24 mil pessoas ao ano, totalizando um gargalo de 300 mil profissionais até 2024”, alerta o relatório. 

Letícia Piccolotto, fundadora do BrazilLAB, explica que o gap é tanto numérico, como qualitativo. “Do ponto de vista qualitativo, o desafio reside em formar pessoas que tenham as habilidades e competências necessárias para o mercado de trabalho. É preciso que as instituições de ensino mantenham uma conexão constante com o âmbito profissional para que possam melhor preparar os estudantes para os desafios que devem vivenciar em sua atuação”, diz. 

Para ela, isso significa garantir uma formação prática, com base em problemas e que estimule o desenvolvimento tanto de hard skills (as competências técnicas) quanto de soft skills (competências socioemocionais). “Há uma alta demanda na área e as posições abertas são difíceis de serem preenchidas. Algumas vagas específicas chegam a ficar abertas por mais de dois meses (caso de 50% das vagas de engenharia de software, muitas para desenvolvedor full-stack, entre outras)”, diz Piccolotto, que frisa também o desafio de trazer mais diversidade ao mercado de trabalho de tecnologia.

Letícia Piccolotto, fundadora do BrazilLAB. Foto: Divulgação.

Precisamos também ampliar a participação de mulheres e também de homens e mulheres negras nas diversas profissões do mercado digital

Letícia Piccolotto, fundadora do BrazilLAB.

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AlphaEdTech vai capacitar e dar emprego para pessoas em vulnerabilidade

Segundo o relatório, a maioria dos profissionais digitais são formados por instituições de ensino superior, por meio de cursos de longa duração, o que não soluciona o déficit de profissionais a curto ou médio prazo. Foi pensando nisso que a CEO e fundadora do Instituto Alpha Lumen, organização brasileira voltada a ações de impacto social e formação de jovens talentos, Nuricel Villalonga, criou a Alpha EdTech, uma ONG code academy que oferece ensino – inicialmente à distância – para pessoas em vulnerabilidade social que queiram fazer uma transição para uma carreira digital. 

Com o foco em criar oportunidades para quem deseja trabalhar com tecnologia mas não tem condições de pagar por um curso ou se dedicar a uma formação gratuita em tempo integral, a iniciativa oferece remuneração de R$ 1.000 aos estudantes e garante emprego ao final dos três semestres de curso.

As inscrições do curso começaram nesta sexta-feira. “Vamos fazer a pré-inscrição de candidatos e começar o processo seletivo para esse primeiro grupo. A cada semestre teremos um grupo novo”, explica. A seleção será online e o candidato passará por entrevistas, oficinas e trilhas de orientação além de uma assistente social para verificar a estrutura socioeconômica do candidato. “Aqueles que nesse primeiro momento não entrarem nas turmas, outras trilhas serão propostas para que eles se desenvolvam para iniciarem no próximo ciclo”. 

Segundo Villalonga, o curso tem três semestres de duração.

Nuricel Villalonga, fundadora e CEO do Instituto Alpha Lumen. Foto: Divulgação.

Em seis meses, os alunos completam o primeiro ciclo e passam a trabalhar metade do tempo em uma empresa e a outra metade continuam nesse treinamento. Em mais de seis meses já saem empregados

Nuricel Villalonga, CEO do Instituto Alpha Lumen.

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O curso conta com mentoria executivos de empresas como Stone, Hash, Brex, Vitta, DEVELL e Farfetch. “A maior parte dos brasileiros não pode parar a vida por dois anos para estudar, então a gente viabilizou dessa forma”, diz ela. A ideia, segundo a fundadora, é começar o primeiro ciclo com 50 alunos e em dois anos atingir 1 mil.  

João Miranda, fundador e CEO da Hash. Foto: Hash/Cortesia.

“Hoje, vemos muitas empresas estrangeiras buscando profissionais brasileiros. E esse movimento se intensificou com a chegada da pandemia, que nos forçou ao trabalho remoto. O grande desafio das empresas brasileiras está em capacitar esses profissionais e encontrar formas de mantê-los no mercado local. Para isso, é preciso formar pessoas e criar vínculos por meio de oportunidades como esta da Alpha EdTech, por exemplo”, disse João Miranda, fundador e CEO da Hash. 

Piccolotto explica que para ampliar o número e a qualidade dos profissionais digitais é preciso combinar ações de curto, médio e longo prazo e, ao mesmo tempo, envolver atores do setor público, da academia, da sociedade civil e também do setor privado.  

“As experiências internacionais para fomentar o ecossistema de profissionais digitais são muito importantes e nossa pesquisa mapeou 32 cases em 14 países que servem de inspiração para os esforços que teremos que trilhar nos próximos anos caso queiramos, como país, estar preparados para a revolução tecnológica”, disse, embora ressalte que o desafio do Brasil deve ser cada vez mais construir soluções e avanços que considerem o contexto do país.